RASCUNHOS INACABADOS: uma carta para o amor

Primavera De Oliveira

    Hoje acordei de manhã e comecei a escrever cartas. Prometo cortar cada pedaço da sua insignificante existência. Desmembra-lo como se cada pedaço fosse uma verdade. Como se a cada respiração eu sentisse sua alma. Prometo matá-lo infinitamente. Sublimemente. Até você pedir perdão.

Colocarei cuidadosamente as palavras em linha retas, cada uma seguida de um corte profundo e solitário. Uma miserável dor, cortando artérias e pulsos. Até que eu consiga fazer você sentir a vida. Irei sugar cada gota de sangue em suas entranhas malditas. Sufoca-lo até você se perder na mais profunda agonia. E morrer. E novamente morrer. E depois… Viver!

Apenas um sopro. E depois abraçar todos os pesadelos contidos em nossa alma. Até que nossos gritos despertem nossos olhos. E envolvam nosso coração empobrecido. Tenho tantas maldições. Somos migalhas. Pedaços picados de desafetos. Paixões vulneráveis. Amores ridículos, toscos. Perdemos nossas esperanças em um banheiro imundo de uma   lanchonete, no meio da rodovia deserta e solitária.

Somos carnes estilhaçadas, buscamos o saber. Esse conhecimento maldito. O amor apenas uma taça jogada sobre a mesa, depois de consumido. Não preciso fechar os olhos para ver você. Está aqui pertinho. Crescendo como uma erva daninha sobre minhas entranhas. E eu aceito. Dou gargalhadas. O ar vai comprimindo meu peito. Meus olhos buscam o abismo. Busco a morte em uma singela canção. Eu sei. Eu sei.

Apenas sinto meu corpo despencando no abismo. Pular, gritar e depois lembrar. Aquecer todos os meus pesadelos. Poder tocar as pontas de meus dedos sobre seu rosto. Sufocar todas as minhas lágrimas em seu peito. Não quero amar. Apenas um instante que eu possa respirar. Vejo você tão perto. Tão intenso. Tão belo. Nebulosas canções.

Sim! As manhãs são nostálgicas e as noites perturbadoras. Elas desvelam nossa alma corrompida. Eros, demônios, sangram sobre colheitas devastadas de insetos. Poder colher os últimos grãos.  Apenas um pouco. E então, preencher a vida. Poder finalmente sorrir e esquecer. E depois pular de todos os abismos. Morrer com um leve sorriso junto com seu corpo em meu peito.

Posso cantar uma canção para você? Ela é suave, sorridente, manhosa. Acredito em nossos fantasmas construídos com tanto prazer. Somos calmaria tempestuosas. Sorrimos para nosso barco não naufragar. Sorrimos demais. Cantamos para nossos demônios pessoais. Amo cada um deles. Todos eles. Acredito em cada um. Amo todos.

Bom, irei começar escrevendo cartas para você, usarei todos os meus sentidos. Todos os meus demônios. Em cada linha irei morrer. Vou abrir o meu peito calmamente e sangrar devagarinho.

Todos os dias uma pequena morte. Até que você compreenda que a dor não é só sua. A dor é nossa, somos carne pisoteada, sangrando pela vida. E ainda assim insistimos em caminhar, sangrar.

Eu sinto todos os seus arrependimentos. Suas decisões erradas. Seus caminhos tortuosos que te levaram a essa insanidade. Seus devaneios intensos, seus sonhos abortados e depois jogados em uma lata de lixo. A vida totalmente interrompida. Cravada de espinhos, pedras pontiagudas, sol intenso sobre o seu corpo pulsante.

Somos matérias gastas, rotuladas de solidão. Lâminas barulhentas cantando canções vorazes. Tragamos a vida em um segundo. Sentimos tanto. O peito sangra. E como é bom sentir a angústia ensurdecedora; ouvir o lamento da noite. A luz mostrando sombras. Depois o apagar da vida.

Primavera De Oliveira

Sempre imaginei que meu amor seria doce e envolvente. Porém, sempre foi amargo e insano. Hoje vivo cada minuto de sua insanidade. Dedico esse livro aos amantes e todos os seus devaneios. O amor sempre é doce em almas inquietas e delicadas. A mais sublime de toda a perfeição do vazio inexistente. (Primavera De Oliveira)

Capítulo I

A espera enlouquece. O abismo se transforma em moradia. O amor pago, depois cuspido, pisoteado e estuprado. A imensidão que abraça a alma perdida

e diluída em uma vida de ruínas. Sejam bem-vindos ao meu paraíso devastado de amores gastos. 

(Primavera De Oliveira)

*Instantes*

Novamente as emoções voltaram, seu rosto me assombra. Envolve todo o meu ser. Você me faz companhia. Olho para o precipício e vejo seu rosto, sinto minhas mãos sozinhas. O pássaro no céu estava voando ao lado de outro, enquanto a chuva fininha insistia em demorar a cair. Depois ele voltou voando sozinho, solitário. Livre e abraçando todo o céu.

Vejo você enclausurado na loucura de suas grades invisíveis. A poeira consumindo seu ser. Olho, respiro, sinto toda a sua angústia em se viver. Morrer. E amanhã continuar a morrer, devagarinho. Até mesmo as lágrimas são singelas e delicadas. Tenho tanta tristeza em mim, tantos relicários escondidos e indefinidos.

Somos misérias corrompidas em filosofia, desenhadas em novelos sem fios. Costuramos a loucura, beijamos o tempo. E abraçamos todo o desespero de uma tarde solitária. Precisamos das grades para olhar o infinito.

O abismo caminha dentro nós, cantando e sorrimos drasticamente. Nesse momento começo a sorrir. Ah, como é bom sorrir na miséria indecifrável. Não compramos nenhum abajur, tudo está escuro, sombrio e triste. As lágrimas não deixam meu rosto. A solidão se tornou meu casaco mais fraterno.

Hoje a chuva cai de mansinho. O céu está nublado, apenas duas aves dominam o céu, voaram por um bom tempo em companhia. Depois apenas uma atravessou as nuvens. A outra despencou sublimemente, numa leveza que corrompeu minha alma. Sinto tanta tristeza. Tantos sentimentos. Tantos vazios amordaçando meus gritos.

Sim, o sol tem brilhado tanto na televisão. Mas vejo tudo turvo, brilhos prateados sobre o céu. Parecem pingos de estrelas em faíscas. Não me importo se você já percebeu tão rapidamente.  Eu sei que você já sabe e sente. Mas, não me importo. Nada que não nos tire do chão vale a pena. Confesso que meus olhos estão em prantos.

Não para de crescer aqui dentro. Você me percebeu desviando o olhar por um segundo. Eu sei. Eu percebi. Eu vi.

*Moderação*

Era necessário esquartejar o corpo. Precisava olhar a sua alma. Arranhar a carne. Torturar. Fazer você lembrar. Atormentar você. Buscar nas profundezas todos os seus demônios e ouvi-los. Ah, que voz sublime, pausada, cheia de ponderações.

Esquece Aristóteles e todas as ponderações filosóficas. A alma pede vícios. É preciso buscar os excessos. Todos eles. Desenterrar todos os demônios. Todos os sonhos. Compreender que não estamos sozinhos. Somos carnes, animais desfigurados. Amo o que você me faz sentir. Febre!

Masturbo com seus olhos sobre meu corpo. Fecho os olhos e percebo seu rosto. Sua face emblemática. Seu sorriso despercebido. Os olhos atentos. O universo em perigo. E finalmente consigo gozar com todos os meus sentidos. Toda a minha pele, epiderme, glote e gosto pecaminoso do escárnio vivido. Dou risadas. Fecho os olhos e adormeço.

Amanhã continuo a ser solidão.  Não importo. Minha pele estremece. Meus olhos estão em febre. O gosto. A lembrança. Busco cada pedacinho de seu corpo. Fecho os olhos e vejo você. Absurdamente desumano.

Uma leve ponta de sorriso espantou meu semblante desprezível. Como é bom amar cada pedacinho de suas entranhas. Seu peito exposto. Os olhos negros em forma de contos.

*Solidão*

Triste. Estamos ficando tristes. Desesperados. A insanidade começou a envelhecer. Hoje mais calma e sorridente. O sol de Camus. O calor agredindo. Corrompendo a existência. Olhar o mar e se perder. Sentir. Compreender o vazio.

Perceber os detalhes. E depois entristecer a alma. Construir todos os arrependimentos em fileiras de madeira. Dar vida ao vazio em formatos inacabados. Constelações de grade. Insistir em perceber. Continuar procurando. Saber que existe um vazio insuportável. Acordar e continuar cavando. Depois os desmoronamentos sufocando nossa respiração. Não conseguir respirar.

 Não conseguir. O corpo sendo comprimido, empurrado para o fundo. O céu vai ficando distante. As paredes aumentando, engolindo, cortando.

Meu Deus, temos que gritar! Por favor, grite! Não estou ouvindo. Grita! Grita bem baixinho. Por favor, fale o meu nome. Eu preciso ouvir. Eu preciso olhar e te ver. Não consigo comer. Não consigo me levantar. Estou presa nesse abismo. Você me jogou com tamanha força, nessa cova profunda e sombria.

Vou levantar o rosto e olhar o sol. Talvez seja esse o “estrangeiro” que desperta. Eu sinto aquele sol descrito. Compreendo cada gota de suor. Cada luminosidade descrita de um sol límpido e intenso. Sinto todo o mormaço adormecendo e embriagando o meu corpo. Vamos amolecendo, anestesiando as paixões e todas as suas insanidades. Tenho tanto sol em mim.

*Promessas*

Confesso que tinha esquecido de minha promessa. Poder cortar, sangrar todos os seus malditos poros. Morrer em sua boca. Abraçar o seu peito e sentir todo o calor dos nossos infernos amaldiçoados. Sinto sua presença em meu passado. Não sei em qual rua.

Vejo você totalmente despido. Consumirei toda a sua carne, poros, entranhas, sua glote, saliva, esperma, junto com todos os seus demônios e suas faces. Fecho os olhos e me vejo apertando seu corpo. Esses braços corrompidos. Enfim, poder morrer suavemente.

As promessas ocultas, inseridas em nossa escuridão miserável. Nossos amores superficiais. Nada que crave sobre a carne e despedace, quebre, fragmente nossas entranhas conseguirá sucumbir nossas almas desprezadas.

Nossas devassidões são sombrias, deploráveis. Vejo você absurdamente desumano, insano, cruel e ordinário. Solitário, talvez. Absurdamente perdido. Indecifrável. Totalmente corrompido e amaldiçoado. E como não amar essa imensidão de dor? Toda essa insanidade? Essa busca eterna de poder sorrir e sentir finalmente a vida.

Apenas vejo nossos corpos sendo arrastados pelas profundezas de nossos abismos. O penhasco maldito da vida. Depois mutilado, despedaçados. As rochas absorvem nosso sangue. Subimos. Arrastamos sobre pedras pontiagudas. As mãos feridas.

Os olhos distantes lacrimejam a dor latente do abandono. As feridas sangrando pelo caminho. E não mais olhamos para trás. Apenas o céu carregado de tempestade. E o corpo dormente de tamanha dor, paramos um segundo para percebermos a imensidão de uma vida além do precipício.

Os campos verdejantes. A colina em um quadro exposta na sala sombria. Finalmente silenciamos nossas vidas. Finalmente morremos. Finalmente.

*Desejar*

Não esqueci das promessas. Ah, essa maldita promessa. Apenas o despedaço do mais puro prazer. Gozar sobre seu corpo. Arrancar a sua alma. E beijar todos os seus pesadelos. Depois eu juro que irei apertar suas mãos e olhar em seus olhos. E finalmente amar.

Os sentimentos já começaram a tranquilizar em meu peito. Estou exausta. Escrever é exaustivo. Morrer e depois começar a viver, sentir. Fechar os olhos e conseguir finalmente chorar com um singelo sorriso. Colocar a mão no peito e lembrar. Desejar. Desejamos demais. Somos sonhos gastos. Vivemos vidas atormentadas. Membros mutilados. Imensas horas de torturas. Depois os passos distantes, solitários, esquecidos.

Somos migalhas jogadas pelas avenidas. Ouvimos o trânsito. O barulho exaustivo. Corrosivo. Olhamos para as pessoas. E tudo parece adormecido. O caminhão de lixo barulhento e fétido, e nem mesmo percebemos.

Depois começamos novamente a morrer em pedacinhos. Todos os dias uma chama vai se apagando. Vamos esfriando nossos corpos e cobrindo nossa solidão. Aquecendo. Cuidando avidamente dela como se fosse uma amiga de longa data.

O tempo vai consumindo nossos sonhos. Nossos olhares. Engolindo nossos sentimentos. Depois sentimos o precipício sobre nossos pés. Temos que aproximar, olhar. E novamente jogar nossos corpos no abismo.

E morrer novamente. Subir o desfiladeiro com suas rochas pontiagudas. As mãos sangrando. O peito exposto. As vísceras expostas. O rosto quebrado. O coração estraçalhado. E depois da subida chegamos ao topo. Nem vivos. Nem mortos. Transformados.

Ah, devo me desculpar, “Memórias do Subsolo”, esse sim é meu livro predileto. Menti, levemente. Não! Apenas simplifiquei os sentimentos. Você não iria compreender todos os sentimentos. Cobri um pouco a alma. Dilacerar todos os gritos contidos. Dizer todas as palavras, assusta, corrompe.

Trazemos germes de loucura e insanidade em nossas bocas. Somos matérias corrosivas. Sabemos viver. Dilacerar todos os desejos e sentimentos. Vivemos, até que nossas escolhas nos levem de volta ao precipício. E pulamos. Abrimos o peito com todos os bisturis perfeitos.

*Cartas*

Tinha feito um rascunho, perfeito e inacabado. Sobre minha alma ruidosa, tempestuosa. Sim! A calmaria me tortura.

Acho que você estava escrevendo para mim. Mas, não importo. Fomos forjados em ferro e fogo. Depois jogados no mar gelado da solidão.

    Vejo seu rosto. Vejo você. Absurdamente perdido. Em devaneios. Burocracias malditas. Pilhas de papéis ou enlatados. Não importa. Elas interrompem nossas vidas.

    Fomos marcados em ferro e fogo, forjados na centelha dos deuses e todos os seus dilemas. As memórias nos assombram. Somos sombras de solidão. Sozinhos, juntos com os amigos.

Um mar de calmaria tempestuosa. A febre ardente do desejo em alucinações e pedidos de perdão.

*Leveza*

Ah, não existe calmarias, ventos tranquilos.

Viver é transbordar.

Sonhar. Buscar o inacessível.

 Esperar você!

Uma eternidade.

Por enquanto você mente para você mesmo.

Uma mentira ignóbil.

O gesto. Ah, o gesto.

O gosto do riso.

Não nos perdemos no mundo.

Ah, essa quietude não existe.

Brincar!

A única forma de viver.

Sorrindo para confrontar a alma destorcida.

E nesses reinícios.

Encontros dilacerados.

Eu vejo você agora.

Nesse instante.

Perdidamente em ruínas.

Os martelos maltratam o destino. Construir escadas.

E depois pular para sentir toda a dor. Sentir o indecifrável.

Eu vejo você maravilhosamente perdido.

Como uma taça de vinho sendo tragado e depois cuspido.

Diluído em suas incertezas…

Suas decisões erradas. Gastas.

Tanto amor desperdiçado. Desfalecido.

Suspirou escondido.

 Foi leve.

Minha alma exposta em seu murmúrio exaltando a leveza.

Me lembrei da literatura em confissões de perdão.

As rosas sem fragrâncias.

Deus deve mesmo saber dançar.

Espero toda a decadência em meu corpo.

Até os últimos lampejos

Cortando cada pedaço.

E depois sendo devorada e amada.

Capítulo 2

Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados 
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada.
Que ficou sobre a minha carne como nódoa do passado. 
Eu deixarei… tu irás e encostarás a tua face em outra face. 

(Vinícius de Morais- Ausências)

*Amor*

Não quero piedade ou falsas promessas. Nada que não me arranque a carne, dilacere minha face, terá eternidade. Apenas o amor em febre pulsante e doente. Toda a devassidão em um segundo de uma eternidade. Sentir o mundo em minutos. Olhar a sua face e morrer da mais sublime insanidade.

Segurar seus pulsos e vibrar junto com seu corpo. Olhar o seu rosto e ver a minha própria face. O amor é escandaloso e suave. Amaldiçoado e vislumbrado como uma meretriz em clemência.

Aos santos todas as reminiscências e aos pecadores somente glórias de quem realmente viveu e sentiu a vida pulsando ordinariamente. Somos metáforas ridículas. Mulheres perdidas sobre a noite solitária e incongruente. Mentimos maravilhosamente bem. Seu corpo me acompanha como uma dançarina inacabada.

Ah, como vislumbrei sua doce presença martirizada como um indigente, perdido na mais sublime prisão. O cachorro uivando para a lua, sozinho sobre o vento gélido, incapaz de mover, respirar ou mesmo chorar. Tanta dor exaltando o deserto infinito. As escolhas erradas. Mas, nem mesmo existem escolhas certas. Apenas esse maldito caminhar indissolúvel.

 O único momento de paz, esse único sentimento de leveza, apenas alcançamos quando nos atiramos para dentro de nossos precipícios. Ah, o abismo habita em nossa alma castigada. Tão deplorável essa existência. Extremamente miserável.

*Súplica*

Estou escrevendo com sangue e dor. Você está me fazendo chorar. Por favor, pare! Pare!

Somos retalhados, cortados todos os dias, picados, desmembrados incessantemente. Os sentimentos expostos, vividos, ávidos de amor. Depois somente as pausas. Respiramos.

Não existe fuga. Escolhas. Apenas esse martírio, correndo. Lembrando de nossa vida ordinária.  Meus sentimentos começaram a se acalmar. Aceitar você. Seu corpo. O semblante delicado e fraterno.

A voz suave, mansa. De quem já gritou todos os horrores dentro do peito. Agora o olhar parece que aceita a morte docemente. E como é bom morrer, parar. Conseguir uma lágrima em um rosto empoeirado.

Tenho que dormir novamente. Estou mais uma vez exausta. Perdida. Sentindo toda a minha força escorrer levemente. Os olhos estão cerrados. Não quero abrir, nem suplicar. Apenas seu rosto me conforta.

*Olhe*

Os dias estão velados, gastos e arruinados. E você ainda insiste em continuar. Por favor, olha para o precipício, esse abismo abaixo de seus pés, pule e me abrace. Meu coração já te pertence. Apenas pule. Abrace a solidão. Caminhe pelas pedras. Por entre as sombras, e me ame eternamente.

Seu medo é intenso. Pare de resistir. Não tenho tanto tempo para esperar. Enquanto não sentirmos o chão, e todo o nosso corpo desfeito, não conseguiremos nos reestabelecer. É preciso sangrar todos os sentimentos. Te vejo tão perdido. Tão intenso. O corpo morto e juntando todos os seus pedaços em lâminas afiadas.

*Chuva*

A chuva cai fininho lá fora. Suave. Lava o corpo arruinado. O pensamento distante, sombrio e passivo. Vejo você cada vez mais perto. Sofrendo, insistindo em sorrir. Insistindo em insistir nesse pesadelo. Apague a luz, quem sabe você na escuridão, não consiga ver o fim do túnel.

Apague a luz e comece a olhar ao redor. Depois olhe no espelho e procure por seu rosto. Aquele mesmo que ficou no passado. Quando os dias traziam passarinhos para os seus braços.

 Por favor, fale o meu nome. Até que seu coração consiga ouvir. Por favor, fale o meu nome. Até que sua alma se cubra com minha angústia. Por favor, fale o meu nome. Até que o seu corpo sinta meus dedos tocando o seu rosto.

Por favor, fale o meu nome. Até que você abra os seus olhos e veja o abismo. Pule… Feche os olhos para sentir o vento, e para que finalmente você possa conseguir olhar de verdade. E depois me dê um abraço.

A cada palavra escrita nessas linhas, mas eu me perco em você. Impossível retornar ao início. Jamais será como antes. Você cruzou o meu destino. As palavras serão cravadas em minha carne. Cada uma, letra por letra, tintas e pesadelos em meu ser.

Prometo vivenciar todas elas. Meus demônios são imensos e belos. Talvez ousados, desafiadores. Não luto. Agradeço todos os meus pesadelos. Eles me forjaram em rios de fogo. Depois rochas vulcânicas. No peito o calor continua intenso, vivo. Os olhos. Ah, os olhos, são areias movediças. A boca, blasfêmias sussurram, junto com meus gritos intensos, luxúrias e pecados ordinários.

Aceito todas as correntes. Todos os infernos. Todas as tentativas decadentes. Todos os precipícios. Todos os abismos para ter por um dia o seu corpo. Uma noite dentro dos seus olhos. Um suspiro próximo a sua alma. Um minuto gozando em seu corpo. Ah, aceito todos os abismos para ter você perto de mim. Todos os abismos.

  Fim.

Encerro a primeira parte desses “Rascunhos Inacabados”, com uma angústia imensa. Mas, é preciso parar. Preciso que ele compreenda que os “infernos”, são tantos. As dores são imensas, e os abismos são eternos. Apenas conseguimos fugir por um instante. E então, amamos.

Amanhã irei retornar para esses meus malditos “Rascunhos Inacabados”, “Cartas para o amor”. Sei que nunca serão lidas ou mesmo sentidas. Meu corpo está em febre, náuseas. Você me jogou de volta para o abismo. E eu aceitei sentindo toda a delicadeza do vento sobre minha face. E todas as pedras cortando minha carne. Não se preocupe, irei sobreviver. Você me alimentou de sonhos, fez emergir todos os meus pesadelos de volta para o meu rosto. Eles irão amparar minha queda.

Posso ver no fundo do abismo seu rosto próximo a montanha. O vento me traz uma leve brisa, e finalmente eu consigo morrer com sua imagem diante da minha face. Não tenho medo, apenas uma paz infinita. Finalmente meus pesadelos adormeceram.

(Primavera De Oliveira)

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