Sobre o céu de Fevereiro

SOBRE O CÉU DE FEVEREIRO

PRIMAVERA DE OLIVEIRA

Nuvens indeterminadas de espaços privados. A atmosfera da incerteza. Falsas esperanças congratulam no vazio da desesperança. Desapego. Invisibilidade na multidão.

Tramas nos sonhos dissolvidos. O beijo mais belo. A noite mais infinita cobriu nossos corpos, depois a distância. A falta de sonhos. A frieza de se amar.

Ainda guardo as horas compartilhadas. O lampejo da esperança. Talvez, pudesse ter sido. Ter amado de verdade. Talvez, a presença ficasse no meu corpo. O sonho se sentasse no sofá da minha sala.

Mas, não! Foi embora junto com o ruído do portão. E nas minhas recordações um meio sorriso dissolvendo o infinito.

Amei intensamente. Num lampejo de um minuto. E ficou eternamente grudado em meus pensamentos. Divinamente prazeroso. Na proximidade de seu encontro desejei a paz.

**Feriado**

Desejos relembrados. Encontros marcados. Desmarcados. Momentos. A vida niilista mergulhada nos momentos. Nunca uma trajetória completa. Fragmentos. Instantes indesejáveis. Misérias compartilhadas. Viver num espaço do tempo. Tocar o interfone. Subir escadas. Paredões. Depois saltar do penhasco. Do vigésimo andar. Abafar todos os gritos contidos.

No início da chuva abrir o guarda-chuva. Sem pingos. Tudo seco, organizado e disciplinado. Visto ternos para meu hospício e depois retiro cada peça. Gozo até o corpo não mais aguentar. E adormeço esquecendo que vivo.

Uma pausa. E novamente a vida acelerada. Em círculos viciosos. No feriado a volúpia. O álcool. O nada. Os momentos estéreis. O solo infértil. Deserto. Sem familiares. Sem beijos de pecados.

Tentamos dissolver todos os momentos fraternos. O amor não alcança. Oprimi. Sufoca. Corrói. A solidão suaviza. Amortece. Acaricia o vazio. Sem oscilações. Ilusões tempestuosas. Juntamos todos os nossos sonhos e embalamos com fitas coloridas.

Depois arremessamos nas correntezas. Lindamente abandonados. Somos metáforas de nós mesmos. Perfeitos seres inexistentes.

**Travessões**

A corda girando e a criança pulando. Os amigos batendo mais forte. Revezando a alegria. Os pulos. O riso. O infinito. A infância num único instante. Músicas. Correria. Opressão. Incerteza. O riso incerto. Batidas de um coração abandonado. Trajetórias gigantescas. O tempo bate forte no rosto. Nas despedidas que nunca se reencontram.

Alcançar até o fim do dia sem encontrar um espaço. Um canto feliz. Sem abraços. Sem beijo de esperança. Sem caminhos. A trajetória contida em uma tela invisível e exposta. Sapatos coloridos. Vida discreta e contida. A esperança embrulhada numa loja de tabacaria.

Nenhuma notícia no final do mês. As águas passadas não retornaram. O momento. Buscar o presente. Intensidades. Depois novas tempestades. Recomeços. Euforia. Tudo contido dentro de um enlatado. O grito alucinante preso num pote de geleia.

No final do ano celebramos a vida. As reuniões. Os presentes e todos as suas embalagens em cores vibrantes. O indigente atravessa as ruas e seus parapeitos. O céu parece desabar. As inundações nos bueiros. As crianças nos seus lindos uniformes.

Tic-tac. Tabuadas. O quadro negro. O idioma preenchido nos formulários. Na pasta do desespero. O cinema enfeitado. Os filmes de ficção. Vazios. Sem ensinamentos. Mórbidos e cheios de ação, sem roteiros. Somente falas desprendidas de contexto. O conteúdo é um rótulo de um anestésico. Pílulas solúveis para os momentos de urgência.

Caixas enfileiradas. Filas nos corredores. Nos pátios das escolas. Nas escadas dos sanatórios, shoppings. Lindo! Lindo. Promoções em vitrines. Barbearias bar. Rock bar. Amor bar. Liquidificações da vida. Espasmos. Óculos dimensionais.

Animais abandonados. Figueiras sem frutos. Vidas estéreis. Casamentos estéril. Encontros desagradáveis.

**Batimentos**

O coração pulsa, sangra. Amortece, enlouquece. O discurso de um bêbado no final da noite. Aplausos. O corpo caído. O batimento interrompido, (a solidão é para os inúteis, vazios de alma, de sonhos e amores). Vejo você tão belo. Tão barato. Tão raro. Tão distante. A vida pulsando em alegria, êxtase. Num instante de gozo rápido e desnecessário. Vejo você tão pobre. Alma corrompida. Sem salvação. Queimando no inferno de seus pensamentos. Suas alucinações e luxúria. As músicas de letras pobres e agressivas. Decadência de você mesmo.

O vizinho bateu o carro, ontem, depois que sua esposa fugiu com outro. O amor uma piada de mal gosto. Dou gargalhadas. Adoro isso. O caos. A decadência. A pobreza de se amar. O hospício moderno. A vida é mesmo louvável. Na mudança, poucas malas. No coração maldito, muitas esperanças. E o vizinho ficou retido em sua insignificância, tomando enlatados de solidão. No outro dia não acordou. Desligou todos os seus batimentos com uma corda posta sobre seu pescoço. Foi a cena mais linda que presenciei esse ano. A verdade mais sincera e duradoura. O fim.

Sua família reuniu logo após o velório. O lamento coletivo. Era um homem bom, diziam em coro uníssono. A sua esposa era uma mulher ingrata.

Que gratidão? Apenas desprezou o invisível! Seus batimentos eram fortes. A vida corria no seu peito. Partiu deixando toda a desgraça e seus precipícios.

Ainda lembro do seu canto no final da tarde. Um rouxinol preso sem montanhas. O coração indócil, partiu. Livre! Alma livre.

Alma de alegria. Um coração intenso. Vidas com significados. Propósitos. Sonhos. Batidas de rock. Sábados em pecados. O beijo na boca. Na liberdade. Na intensidade de se viver.

O vizinho foi enterrado ao som de prantos. Debaixo de um sol sem nuvens. Ao som de muitas lamúrias. Nas bocas das velhas de almas desbotadas, com seus maridos encurvados e embrutecidos, cantavam melodias do fracasso. Da insignificância de se viver.

**A vida no seu início**

Os olhos sem brilhos. O corpo que fala. Grita! Explode! Intenso! Jovial! A face da esperança, dos sonhos inocentes. O brilho do início da vida. Da poesia. Dos encontros. Da beleza de se viver. Amar. Amar. Amar perdidamente. A beleza de se acreditar. Buscar sonhar. Esperar. Viver.

Meu Deus, como é lindo o início. As esperas. O encanto. Ah! O encanto! Encantar por uma poesia. Uma melodia, um rosto. Buscar os sonhos. Caminhar acreditando. Rompendo. Sorrindo. Dizendo. Dando gargalhadas. Sentindo.

Poder ter o direito de sentir. Acompanhar o coração. Desligar o relógio e seus miseráveis ponteiros. Parar o tempo, sentir a vida. Ver a vida. Ver o outro e os outros. Tanta beleza nisso tudo. Poder acreditar. Admirar. Querer ser mais, alcançar os sonhos e todos os seus arco-íris.

Um rosto em admiração. Os olhos que se revelam. Os olhos sem cortinas, sem dores, transparente. E o coração sendo compreendido. A vida contém segundos de belezas que depois perduramos. Prendemos na parede de nossas salas. E ficamos lamuriando o passado. Esquecendo de abrir nossas portas. Morremos calmamente dia após dia. Por um segundo podemos nos surpreender. E então, olhamos. Acreditamos. Ah, por um minuto. Apenas por um minuto se o vento batesse em nosso rosto. E então, viveríamos!

Não! Morremos alucinadamente. Mesmo diante de uma canção. Lindamente. Morremos! Adoro isso. Essa morte sem assassino. Esse suicídio sem sangue. Essa histeria do desânimo. A apatia. O vazio intenso. Sem intensidade. Sem destino. Sem sonhos. Morremos perfeitamente lindos. Tanta poesia nisso tudo.

Achei o mês de fevereiro novo, diferente. Tinha você, por um momento parecia ter sentido. Finalmente nessa vida pálida e enclausurada eu vi você. Vestígios de sonhos. Vestígios de um beijo. Insistir. Não curvar. Não aceitar. Insistir! Esperança. Odeio cada uma. Desprezo. Dou risadas. Como é bom rir disso tudo.

Ah, o tráfego. O movimento. As aglomerações. Tantas pessoas obsoletas. Mortas. Trágicas. Vivendo vidas desagradáveis. Pessoas desagradáveis. Banais. Momentos desagradáveis. Vidas estéreis. E você apareceu tão belo e poético. Suaviza a vida. O sonho. A esperança. Essa maldita esperança enclausurada nessa Pandora.

 Estou enlouquecendo. Vivendo. Compreendendo. Sentindo. E não querendo sentir. Quero matar todos os segundos. Dizer não. Sufocar os sentimentos. E assassinar a esperança.

** O mês de fevereiro**

A luz irradiava. O dia era belo. Era início. Era esperança. Recomeço. Depois de tanto tempo, uma pausa para o início. Estava um mês estático. Mórbido. Sombrio. E em silêncio, simples assim, desse jeito, eu olhei. Ainda me vejo te olhando. Suavizou minha alma. Aqueceu o frio. E acariciou a melancolia. Depois a febre. O desprezo. As alucinações.

Era apenas fevereiro. E março nem sequer findava mais as chuvas. O céu de repente ficou negro. Dúvida. Tristeza. Vazio. Novamente, não! Mais um dia, não! Outro dia, não. Outra música? Não! Você? Não!

Mas, era apenas fevereiro. Pobre mês. Pobres corações. Pobre vida. Nunca quis ser primavera. Nem mesmo estação. Apenas a última nota da melodia. Apenas o fim. E você orquestrou do início ao fim. Percebi apenas no final. O arrependimento. A distância. O contato. A palavra não dita. O precipício está tão longe. Em silêncio. Estou cansada. Não consigo alcançar. Não importa a distância. Nem mesmo se está debaixo de meus pés. Ou distante, após a colina. Não importa. O precipício está em mim.

**Niilismo**

Sobre o céu de fevereiro. Aberrações. Demônios. Sentimentos expostos. Canções inesperadas. A batida. O coração. O pulso. A alma desatinada e gasta. Morta, mórbida. Desprezível. Mais uma partida. Outro grito contido na garganta. No peito. Na carne cortada e servida na bandeja do desprezo. O niilismo. Eu. Nós. Todos nós. Mortos. Acordamos sorridentes. Enfeitamos para a vida não sentida. Caminhamos apressadamente. Somos importantes.

Assistimos novelas. Tomamos cervejas em corpos perfeitos. Finalizamos o dia com um lindo sorriso. Histeria em massa. Hospício em embalagens. Familiares soterrados em seus últimos suspiros. Sem pais. Sem irmãos. Sem amigos. Vazios e ocupados. Necessários e desnecessários.

Capitalismo de nação. Homens da nação. Canções mercadológicas. Lógica de mercado. O trabalho dignifica. A fantasia se torna real. O real uma linda história infantil contada pela professora do primário. Lindo! Lindo, lindo. Tantas belezas nesse vazio.

Sentir a vida somente pecando. Distribuindo carne, sangue e sufocando as lágrimas. Virar máquina. Sangrar. Trocar o óleo. As pílulas. Novas novelas. A continuação do seriado. O moleque que corre descalço. Pisar na vida. Beber a vida. Não nascer. Abortar. Viver. E depois desaparecer.

**Formulários**

Reaparecer, Começar. Começos. Reinícios. Inícios. Finais. Lembranças. Esperança. Tragédias. E de novo a vida ressurgindo sob o céu de fevereiro. Longe da primavera, distante do inverno. Tanta luz. Calor. Paixão. Intensidade.  Foi em fevereiro que toquei sua pele. Tão lisa. Tão linda. Tão doce. Tanto sentimento. Depois de tanta pobreza. Tanto amor. Tanta vida em poucas horas. E tanto desprezo por tanto tempo.

A vida uma roda gigante. Nostálgica. Linda. Imensa. Bela. Tanto vazio para uma única vida. Tanto sentimento para poucos segundos. Overdose de calmantes. De sentimentos. De esperança. Apenas o suicídio da alma acalma. Amortece. Suaviza.

E amanhã. O relógio. O tempo. O livro de ponto. A vida contabilizada em horas. Seu gosto. Seu corpo. Minutos em seus braços. Olhar seu rosto depois de beijá-lo. Te amar. Amar. Amar. Sem ter nenhuma esperança do amanhã. Depois acordar e sentir o tempo. As horas. A correria. Olhar a agenda. Agendar a vida. Dilacerar o corpo. Sufocar as lágrimas. E no final assassinar a esperança.

Dilacerar cada pedaço de meus sonhos. E enterrar tudo num terreno baldio. Enfim, poder sorrir em paz. Em alegria. E depois viver o vazio. Abraçar todo o niilismo. E sorrir. E sorrir.

**Pensamentos**

Sempre as escadas. A fala rápida e apressada. Poucos minutos. Degraus. Confissões. Sorrisos. Instantes. Busco você em fragmentos de segundos. Acalmar o coração. O pulso. A histeria. Pensamentos vazios. Tédio. Suicídio. Tanto tempo e agora apenas as lembranças. Os pensamentos grotescos, mórbidos. Trafegar em corredores vazios. Leitos de hospitais em festa. Casamentos barulhentos. Vidas em gritos. Amores estrangulados.

Ainda mantenho as lembranças. A vida que não foi vivida. Preenchida. Não sei. Mas, pensei em chinelos. Calma, descanso. Pausa. Sentir. Viver. E depois desistir, estrangular os sonhos e todas as suas atmosferas solidárias.

Ah, como é bom viver. E como é bom escolher não viver. Pular todos os precipícios. Não pular nenhum precipício. Apenas sentar e contemplar todo o vazio. Olhar. Esquecer. Adormecer. Buscamos vazios. Tecemos labirintos. Perdemos o ponto. O início. Mergulhamos no caos. No desespero. Nas alucinações. Em gritos padecemos. Em silêncio compreendemos. Todos os dias, sonhos. Entre os ponteiros alimentamos nossas feridas.

**Desumanos Humanos**

Humanos em desumanidade. Banalidade. Grotesco. Amor. Pausa. Beijo. Encontros. O soberbo grotesco. Depois a leitura da bíblia e todos os seus provérbios. De novo crente. Descrente. Tomamos todos os dias um cálice niilista. Depois a ressaca. Os sentimentos. Os desprendimentos. Em contas bancárias. O carro do ano. O piso da moda. A cor do granizo. A pintura fresca e o sorriso falso, estrangulado em notas, créditos.

Ah, a vida tão bela e narcisista. Tudo inválido. Nos produtos o prazo de validade. O bicabornato no leite coalhado. A vizinha e seus apliques. O portão ao lado rangendo lindas sinfonias.

Meu cachorro deprimido. O gato do vizinho canta uma tristeza infinita. Estamos todos doentes. Tudo tão belo e poético. As garrafas de vinho vazias. O coração vazio. A vida vazia. No final do dia o troco. Os produtos e todas as suas belas embalagens.

Sábado as redes. As mídias e seus holofotes. O invisível. O visível. O belo. Perfeito. Vidas perfeitas e belas.

No domingo de novo a corda presa sobre a janela e o olhar afastado, parado e mórbido. A beleza em empresas de estética. A vida magra. SER magra em anúncios de outdoor, panfletos nas ruas, placas decorativas. Anúncios em redes. SER magra, esbelta e bela. Lindo. Poético. Vibrante.

SER. Poder estar presente. Presentear a vida, o outro e os outros. Tanta beleza nisso tudo. Chega! Chega! Estou exausta. Ansiosa.  Triste. Parada. Morta. Niilista.

Fevereiro. Mês da luxúria e seus pagamentos. Contas. Projetos. Carnaval. Feriado. Fregueses em ofertas. Piscinas poluídas. Laticínios. Sem glúten. Nova direita. Novo paladar. Novo encontro. Outros encontros. Outras histórias. As mesmas histórias. Os mesmos dilemas. A mesma mesmice. O mesmo paladar, azedo, amargo. Ele esperava sua decisão. Trocou trocadilhos. Imprimiu todas as suas impressões. Não era seu dia de sorte. Trocou ilusão por ilusões. Lindo. Lindo.

O Natal está distante. Mês mágico. Vermelho de amor. De sangue pulsando a vida. Nos enfeites pendurados sobre as janelas. O vulcão Etna em erupção. As embalagens em cores vibrantes. Energético para continuar. Mais um sopro apenas. Mais um dia. Somente hoje. Amanhã café. No final de semana talvez eu durma. Talvez todos nós nos encontremos em uma mesa de um bar. Todos felizes, celebrando a vida.

Os enfeites de Natal, dourados em estrelas cadentes, a natureza verdejante sobre os plásticos revestidos de relva. Belo. Muito belo e prático.

Os porta-retratos sobre as prateleiras. Menino Jesus decorando a sala. Tudo muito cristão e fraterno. E nas veias expostas o sangue niilista bombardeia o marasmo de se viver. Vazio. Buracos imensos. O coração oco, pálido, doente, viciado em aspirina. Lindo. Lindo.

Remédios, corredores. O carrinho da limpeza. O balde com água suja. A vida parada. Dengue. FEBRE, convulsões. Azedo. Vômito. Náusea. Purificadores de ar. A moça da limpeza. O mal humor. O sapato de salto alto. Corredores. A vida pelos corredores. Iluminação artificial. Comida artificial. Prazer instantâneo. 

Encontros inexistentes. Vida bela. As joias falsas. O sorriso em porcelana. A miopia. Os produtos transgênicos. Travesti. Gêneros. Feminismo.  Masculino. Feminino. Combinações. Individualizações. Padrões. Padres confusos e em depressões. Tratamentos. Nos cursos de psicologia, literatura e esoterismo. A verdade absoluta. Padrão. Clichê. Em suma. Ah, que horror. Feio. Não tem beleza. Feio. Horrível.

O batom vermelho, seco. A vida seca. A amizade vazia, inexistente. As reuniões de trabalho. Os infelizes. Felizes em sua solidão. Paraíso. Uma cidade de ouro e cristais. Deus me livre. Horrível. A vida pede terra fofa, macia. A alegria do descanso no final do dia. Não imagino um paraíso sem antes ter sido devastado pela guerra. A paz no caos. A companhia do olhar atento sobre a vida. Sufocar a solidão com um singelo bom dia no início do dia.

**Pecados**

Não existe paz na tranquilidade. Ela adoece, tranquiliza o coração. A vida. Escolhemos nossos carrascos. Mentes insanas atormentadas pelo gosto do pecado. Da vida. Dos sentidos. O prazer. O corpo. Todos os sentidos. Sentir a liberdade. Depois a queda. O preço. A Bíblia e seus provérbios. Depois novos vícios lícitos. Novas obsessões. Construções de paraísos. A necessidade do mal. Das leis e suas regras. Aplacar os sentidos. Viver o vazio. Mergulhar na palavra. Neuroses. Delírios. O corpo e suas abstenções. O não. O precipício. As regras. O sofrimento como graça alcançada. Que horror! Que Deus feio. Uma velha maldita. Deus uma velha de semblante caído, ventre morto, pele flácida. Olhar sem brilho. Boca maldita. Deus uma velha decadente.

O inferno cheio de jovens alegres em comemorações. Adorações. Celebrações. Músicas, danças, corpos, bebidas, gosto, desejo. Entorpecer até adormecer a alma. Apagar todos os sentidos de tudo isso.

Viver! Viver até o último instante. Beber até a última gota. Satanás em corpos femininos. Éden. Afrodite. Vênus. Criação. Compreender a vida. Perceber a vida. Viver. E depois vazio. Niilismo. A busca do irmão. A gratidão. A complacência. Os valores cristãos. O próximo. O outro. Os outros. A palavra. Meu Deus, que inferno. Que decadência. Uma eternidade num corredor escuro, por uma vida sentida. Brindar todos os niilismos. Abrir um parêntese. Um instante. Pecados. Conseguir viver todos eles. Sentir todos eles. Pecados. Consumir cada um.

**Lamentações**

O recomeço. O arrependimento. O fim. O reinício. A plateia. Os discursos. O inferno em parábolas. Morais, éticas, ensinamentos precisos para não se viver.

A receita. Os conselhos. Mil ingredientes. Menos o amor. Amar a vida. A chuva. O frio. O sorriso inesperado. A solidão. Beliscar o braço e perceber a vida. Acordar. Sentir saudades. Recordar. A correnteza. As folhas. O caminhar. A beleza. O belo. As estrelas. O jardim. O grito. Os olhos de quem aprecia tudo isso. As almas que se encontram e depois desaparecem. Tecem novos relacionamentos. Novas vidas. Outros ensinamentos. Novamente o início. O começo.

Somos tantas palavras perdidas. Não ouvidas. Somos tantos sentimentos desprendidos. Temos tantas alegrias e dores. Tantas belezas próximas e distantes. Tantos encantos. Turbilhões de emoções. Matamos Deus e revivemos esse mesmo Deus. Sufocamos nossas dores. E depois buscamos a esperança, o fortuno, a bonança. As recompensas. Outros mergulham na caverna da tristeza. No labirinto da redenção. Outros apenas vivenciam todos os desejos.

Tantas vidas. Tanta vida. Tantos sentimentos. Viver. Viver intensamente. Viver perdido. Viver tentando. Viver sem compromisso. Viver instantes, momentos. Enfim, viver.

Cocaína. Enfim, sentir. Não sentir. Desligar. Sentir todas as emoções. Pecados? Não! Viver! Sentir! Até a exaustão! Psicose. Esquizofrenia. O raciocínio lento. Morto. O mal humor. As crises. A loucura. A depressão. O desespero. A obsessão. Os provérbios que não acalmam a alma. Mata. Matam o corpo. O homem. Os sentimentos. Vazio.

A ansiedade. Os olhos que não conseguem dormir. O calor no peito queimando a esperança. Viver intensamente o vazio. Amar a solidão. O desprezo. A incontingência. Tecer encontros. Tantos demônios acompanhando meus passos. Amo todos, cada um. Saber ser companhia na ausência. Criar construções. Abandonar todos os lares. Conter as falas. Os sonhos. A poesia. Os martírios. E depois desprender o resto da vida.

**Instantes**

Apenas um toque. Sobre a pele. Busquei sentir aquele minuto por horas. Alcançou meu coração fatigado. Por um minuto. Mas, logo todo o sentido se desfez. Não perdurou. Poderia tanto tê-lo amado naquele minuto. Mas, não. Não. Recolher o amor. O gosto. A carne beijada e exposta. Cortada. Revirada. Vívida.

**Hoje**

O amor congelou a alma. Os desatinos. Os martírios e seus murmúrios. A festa no final da noite reuniu todos os anseios. O instinto. As cores vibrantes. Os copos sobre as mesas. O lixo. Os restos. As vozes embriagadas. Os lampejos. Mais um lindo dia cortado do calendário. Depois a volta. O início. O começo. Novamente nada. De novo esse peso. Essa histeria dessa vida estéril. Febril. Pacotes, embrulhos. Laços. Barulhos intermináveis. E você nem mesmo apareceu. Apagou todos os rastos. Todas as fotos. Todas as histórias. Que lindo! Belo!

Hoje. Apenas hoje podemos viver. Depois, saudades. Lembranças. Sorrisos discretos na nossa face. Somente hoje. E depois veremos nossa solidão. Nosso egoísmo eterno. Nossos vazios. Nossa incapacidade de amar. Tanta filosofia para nosso vazio.

**Segunda-feira**

Esperar novamente. Depois continuar esperando. Tentando. Amando. Vivendo. Conversando. Hoje. De novo, hoje. Sufoca. Oprime. O céu todo azul. Horrível. Azul que cega, deprime. Insensatez. É bom. Muito bom. Simplesmente não analisamos, fazemos naquele exato instante. E é bom. Momentos. Vivemos esses lampejos de instantes.

Um mar de rosas picadas jogadas no chão batido e indigesto. Sofrer as consequências das decisões mundanas. O relógio no pulso lembrando os minutos genuinamente autênticos. A obsessão pelo amor perfeito. Pela vida perfeita. A cor da sala perfeita. O sapato perfeito. Belo.

Um dia um amigo meu me disse que relacionamentos são iguais a sapatos. Podem ser macios, confortáveis, mas esses estarão gastos, sem brilho, sem academia, cirurgias plásticas, roupas opulentas. Apenas a maciez que abraça a alma. Congela o tempo. Envolve o pensamento. Acaricia o coração. Esses sapatos são os melhores e mais sinceros.

E existem aqueles outros sapatos belíssimos e em cores exuberantes. Barulhentos nos seus passos. Chamativos. Envolventes. Porém, a cada dia pisado um pedacinho da carne vai sendo cortada. O caminhar vai ficando lento, triste. Pesado. Mas, insistimos, são belos. Combinam com a vida, com outros corpos. Outros passos. Vivem rodeados na histeria da vida. Das festas. Do álcool. Da alegria.

E os pés? Martirizados.

Depois percebemos o estrago. Colocamos curativos. Acariciamos. Ficamos quietos, parados. Vazios. Expostos. Sem calçadas. Palcos. Festas. Sorrisos. Abraços. E começamos a andar descalços. Solitários. Na mais profunda desilusão. Tentando enganar nossos erros. Nossas escolhas.

E depois disso tudo, nem sapatos velhos ou novos. Nem a paz ou o caos. Aprendemos a voar. A olhar. A nadar. Escalar. Nossa caminhada não precisa de sapatos velhos ou novos. Precisa envolver o coração. Os sonhos. As lembranças. Os minutos sentidos pelo toque na memória. O leve sorriso quando toca à música preferida. O coração acelera. E o tráfego da segunda-feira fica por um minuto paralisado. Momentos eternos em instantes.

Os sapatos… O amor. Esse sublime sentimento que acaricia a alma. Depois os pés livres, pisando sobre a terra. Mergulhando no rio. Sentindo a vida. A paz.  Essa compreensão infinita que envolve o corpo e acalenta os sentidos. Tranquilidade. Saber compreender os instantes. Perceber os outros. E tantos sentimentos. Tanta vida. Tantos ventos soprando.

**Insanidade**

Buscar o invisível com os pés fincados no chão. Impossível sentir os ventos e todas as suas imprevisibilidades.

Morrer infinitamente. Depois continuar. Andar exaustivamente para depois parar e olhar, sentir. Vivemos em uma continua rotina. Nos mesmos passos. O mesmo rosto. Na boca o mesmo gosto. No corpo a mesma alma desatinada.

**Sonhos**

Diluir as esperanças dentro de um copo raso e sujo. Buscar palavras para os sonhos nem pensados. Na euforia da entrega o gosto amargo do vazio indigesto.

Os homens estabelecem tantos sonhos. Nas horas estendidas, nos feriados, planejam, sonham. O prazer em cápsulas. Na melhor escolha do seriado. No bate papo sério e emblemático.

Nos novelos desenrolados vamos colocando alguns travessões. Nunca o ponto final. Nem conclusões. Apenas enredos, diálogos inacabados. Finais reiniciados. E todos os vícios modernos cantarolados na multidão.

**Fevereiro**

Sobre as nuvens de fevereiro. Entre alguns pontos do infinito e próximo do precipício. O sol escaldante queimando a pele grotescamente. Os sentimentos paralisados e adormecidos. As cores vibrantes pelas ruas da cidade. Pacotes, laços, placas, carros desfilando pelo asfalto. A primazia disso tudo.

Papelões. Balões. Liceus. Ginástica localizada. Palácios contemporâneos. Subir as escadas dos monastérios. Cantar sinfonia no sol do meio-dia. Tic-tac. Transformações. Girassóis. O arco-íris no reflexo da janela. A transferência sobre a vida. As embalagens empacotando todos os brilhos e sentimentos.

**Amanhã**

No canteiro verde e extenso, apenas uma flor vermelha emergia. De longe os olhares cobriam cada pétala. As lagartas pareciam ter visitado cada folha. A flor continuou austera. E o canteiro enegrecido de formiga e lagartas. Tudo em volta devastado. O caos consumindo cada partícula. O gosto amargo da bebida consumida junto com os amigos.

A morte anunciada nos olhos. O final próximo e seguro. Visível. Opaco. Consumido em cartelas e proteínas   após os exercícios da academia. Músculos. Gorduras. O excesso de peso. A vida não vivida caminha lentamente com a respiração ofegante. A obesidade que engoliu os dias. A pausa. O cansaço. O desânimo. O sono. E a gordura engolindo os homens.

Amanhã talvez a humanidade possa começar a caminhar. Recuperar os sonhos, o ânimo de se viver. Reunir e compartilhar partículas de esperanças.

As tatuagens cobrindo os corpos. O sentimento que não existirá amanhã. Apenas o hoje e agora. O amanhã demora, oprime. Está tão distante. A manhã ainda é uma criança. E a maturidade apenas no final da tarde. E a noite uma velha com insônias, tomando seu drink, fumando um cigarro sem esperanças ou sonhos. Apenas agora. Hoje.

**Cartas**

Um peso morto estendido na esfera do redemoinho de vidro. Consumir todas as energias e correspondências. No barraco do final da rua, mora a cartomante com sua esposa e três filhos. A cartomancia. Cartas de baralho. A pobreza diluindo a razão. As crianças felizes e sorridentes. Belezas exauridas de qualquer sentido.

O destino jogado na atmosfera de seus familiares. Corações compartilhados e humanizados. Fugir da realidade. Do caos desembrulhado. Migalhas de afetos.  Construções desiguais. Paredes desmoronando durante o dia. Tramas oferecidas em mensagens. A necessidade do afeto. A comunidade distribuindo sorrisos e abraços. O sentimento de solidão engolindo os homens.

Jogos virtuais. Poltronas individuais. Salas compactas. Vidas dormitório. Bairros dormitório. Condomínios de segurança. Momentos de liberdade presos ao sexo seguro e descartável. Amores confeccionados.

Fevereiro e os novos horóscopos. Os antigos relacionamentos retomados em santidades. Os mesmos erros atualizados. Congestionamentos de mulheres embriagadas. O milagre da vida em diversas doses.  Os anjos cantam canções. O corpo sangra. Vermelho intenso. Precipícios. A ligação nunca ouvida. O amor que nunca suaviza. As batalhas que nunca acabam. Suplícios. Caos. Paz. Semblantes desfeitos. Corações rebeldes demais para todas as correntes que continuam a viver. Viver!

**SIM**

Os pensamentos buscavam lembranças. O coração lutava bravamente. A guerra emergia. Aceitar ser amor. Permanecer distante. Torturar a esperança. Assassinar os sonhos. Mil vezes sim. Até a vontade sucumbir ao vazio.

Engolir todos os outros. Até os olhos enxergarem somente desertos. E as flores florescerem em vasos estéreis.  E todo o solo contaminado. Dizer sim para o vazio. Até o corpo pesar sobre todas as verdades. E a morte respirar todas as belezas e suas paixões.

E quando a primavera finalmente for sepultada e as noites se tornarem dias. O amor finalmente velado. A paz ininterrupta alcançarem todos os corpos. Então, o vazio sucumbirá e alcançará todas a almas. Lindo. Lindo. Niilismo. Vazio.

O presente de hoje em corpos jovens e corações velhos. Sem ânimo. Desiludidos. Estéreis. Inúteis. A juventude em rostos lindos e com a face envelhecida e entristecida. O lamento profundo e morto. Sim.

**Lembranças**

O barulho da água correndo fininho. O sentimento profundo. A dor de amar. As facas cortando cada pedaço. O olhar que desvia na pele a dor grudada. O corpo enxugado e acariciado. A dor de ser amada. O sentimento perturbador e infinito. Os olhos pedindo a calma.

O desejo que tudo acabe e desapareça. O vazio se alastrando por todos os ambientes. O sábado desprendido nos beijos dos amantes.

Qual a canção perfeita? Como contemplar todas as estrelas? O corpo febril. Dilacerado. Amargo. Infeliz. Invisível.

**O Gozo**

O corpo suado dos movimentos perfeitos. A boca molhada. O lábio em veludo acariciando o corpo. A pausa. O movimento. Os dedos apertando a carne. O rosto deslizando sobre o corpo. A pele quente e úmida. O gozo prendido. O momento sendo sentido. A respiração intensa. O coração revelado. A mente sublime. Os instantes de lembrança. E depois novamente o retorno ao sexo. O prazer intenso.

O calor do corpo apreciado e absorvido. O sexo desembrulhado e consumido. A boca sendo devorada. As mãos apertando o corpo. A alma. A epiderme exposta. Os olhos excitados. O momento eterno em minutos.

Depois o vazio. O vazio extenso no peito e engolindo todas as entranhas.  A solidão de quem está só. O momento consumido e descartado. Apenas um instante de prazer e vazio. Nada. Sexo e gozo. Corpo e prazer. Vazio e sua imensidão negra e obscura. O vazio sendo expandido. A náusea. A indiferença. O nada.

Viver o nada em segundos. Indiferente. Belo e vazio. Sexo e doses de bebidas. Insulina. Diabetes. Injetar um pouco de ânimo para a vida débil e estéril. Apenas um pouco de oxigênio para quem está perto do fim. Um segundo de chamas. Uma pausa rápida e efêmera. Nada. Visceralmente nada, exposto em corpos vazios. Instantes de gozo. De vida. E novamente o nada.

**Nada**

Viver sem lembranças. Buscar momentos perdidos no infinito distante. Chamas de solidão aquecendo a alma. Varrer todos os resquícios de alegria e êxtase. Sorrir sem alegria. Dizeres vazios. Nada.

Deixar ruínas em corações frágeis. Impossibilidades de amar. Aceitar o vazio. E corromper o amor. Buscar o nada e sorrir em lábios modulados. Tudo perfeitamente falso.

Corpo estéril. Coração desprendido. Falsidades. Superficialidades. Mentiras. Não aceitar a alegria. Viver num emaranhado de ingratidão. Corpo falso de uma vida vazia. Contaminada pela desgraça de não se viver. Adormecer. Aceitar. Permanecer o mesmo objeto, ornamentando a vida e sem vivê-la.

O desperdício de um sonho. A não realização de uma esperança. Morrer e aceitar o fim permanecendo sentada sobre o olhar no horizonte. Desesperança que arranha a carne e expõe todas as feridas.

Cicatrizes invisíveis. Ofensas estendidas e aceitas. Permanecer no silêncio. Viver sobre a indiferença.

As flores em seus lindos vasos ornamentais. Mãos que cuidam e regam todas as rosas medíocres. As pragas que se alastram após as chuvas.

Chover até estragar todo o jardim. O mato ruindo, alastrando e sufocando toda a vida. Todas as rosas mortas ao solo e expostas.

E no final, apenas a indiferença. Sem lamentos. Esquecer os sonhos. Sufocar a esperança. Estrangular a dor. E respirar. Pausadamente. Em silêncio. Em comunhão.

O amor ficou em uma esquina pacata e vazia. A luzes dos postes estavam sombrias e mal iluminadas. As ruas desertas e abandonadas com suas cores nebulosas.

O silêncio parecia gritar, gemer em seus ruídos. Algo que agredia a paz e o vazio.

A rua era deserta. Os postes eram verticais com luzes desiguais, iluminando a penumbra. Refletindo a solidão. Na esquina cantava uma melodia silenciosa e dramática. O cesto do lixo. O lixo. O piso de concreto. A luz refletida do poste. E o coração bombardeando solidão. A vida parecia suspirar.

Por um momento aceitou a vida. O sangue bombardeando. A boca em chamas. Os dedos que acariciaram a alma. A pele acariciada e pressionada com tanto zelo. Os poros expostos, lambidos e devoradas em um único minuto.

Por um segundo sentir a vida. Espremer a vida. Arranhar a vida. Sufocar a vida. Tocar a vida. E finalmente fechar os olhos e sorrir.

**Fevereiro**

O céu era imenso em nuvens dispersas. A tarde brilhava. A vida sujeitava os homens. O sol flamejava. Os olhos pararam. Olharam. Sentiram. Vibraram.

Um segundo e uma pausa. O silêncio da alma. O corpo em febre. Em seu calabouço. O corpo gritava, esbravejava em seu leito de morte. O corpo niilista. Uma alma carregada em um vazio ensurdecedor.

Por um instante. Um breve momento. Algo gritou na minha alma. Desejei que o sol se apagasse. O mar secasse. As nuvens descarregassem tempestade. E que o mundo por um curto momento se deteriorasse. E que eu nunca tivesse olhado.

Ah, caminhou. Travou guerras. Olhares, gestos. E o niilismo se tornou desnecessário. Assim deve ser os amantes. Os amores em seus juramentos. A chuva em suas tormentas.

**Esquecer**

O desejo de apagar na face o sentimento revelado e exposto. Sentir a solidão. Viver a desilusão e o infinito em um único dia. E no amanhã retornar ao mesmo vazio.

Tentar esquecer o beijo. A conversa que desperta a alma. Os sonhos. Os instantes sentidos. A paz dilacerada.

A busca do improvável. Do esquecimento prolongado e infinito. Estamos fadados ao inevitável vazio existencial dos nossos dias, compartilhados loucamente. Nos dias não vividos. Aprender a conviver com o vazio. A espera. A conviver com nenhuma espera. Nenhum sonho.

Viver sem propósitos. Sem sonhos. Sem esperança. Alimentando nossos vazios indissolúveis. Tragédias humanas. Vidas humanas sendo ceifadas. Degoladas e expostas em postes virtuais.

Olhares sem compaixão. Frases bonitas e destituídas de qualquer sentimento. Tradições burocráticas. Caminhamos soberbamente amargos. Trivialidades. Novos pacotes de embrulhos. Vidas embaladas. Seu olhar foi tão belo e encantador. Tocou no peito. Sentir a carne viva e ter o prazer de morrer.

Como esquecer um único olhar. Um instante da vida. Um pedaço de sorriso desprendido sobre minha face. E depois gozar em outro corpo. Outra pele. Morrer em outra boca quente e nefasta. Sentir todo o calor de outra alma. Outro ser. Outro coração. E no final expandir todo o vazio encoberto sobre a pele.

Como é doce morrer. Como é amargo viver. Canções sombrias. Vidas vazias. Superficiais e empacotadas. Embrulhos brilhantes e barulhentos. Comer a vida. Engolir o amor. Dilacerar os sonhos. E sorrir imensuravelmente. Buscar primaveras em tudo. Aceitar o deserto. O céu carregado de luz. O corpo sombrio e morto deslizando sobre as areias.

Secar toda a esperança. E cantar o mais alto. Desfigurar a face. E sorrir docemente. Histericamente. Nada importa. Apenas acordar mais uma manhã vazia. Tomar o café. Dizer bom dia e sorrir. Sorrir alegremente.

**Quarta-feira**

O portão aberto…

A alma levemente sorriu…

Apagar o amor. Apagar o seu rosto. Seu toque. Suas mãos. Sua boca. Seu peito. Seu suor. Sua alma. Sua face. Seus olhos. E esfaquear meu coração com toda a força até que sua lembrança fique perdida por um segundo.

E depois começar a construir o meu labirinto. Minha prisão. Meus anseios. Minha eterna e duradoura solidão. A incapacidade de amar. De viver eternamente. Apenas frações, instantes, momentos, segundos de um amor desatinado. Perdido. Sufocado em suas misérias. Delírios.

Deixei entrar pelo portão. Pelo meu corpo. Minha pele. A boca sangrava quente e ruidosa. Devorava cada parte de minha carne. O corpo junto em transe perfeito. O movimento em sintonia. O peso. As mãos ruidosas. A pressa desenhada sobre as curvas.

A admiração. O nervosismo. O toque. A proximidade do desejo. A necessidade do amor. O olhar desviado e anunciado. O coração trancado e enlouquecido. E o corpo em histeria. Em febre. Em luxúria. Em gozo. O gosto do amor na boca. No corpo. Na face. No grito. Na respiração ofegante.

Os lábios devorando o outro. O mesmo. O mesmo desejo. A mesma vontade. A mesma vida. Linda e desiludida. O mesmo olhar de prazer e vazio. O mesmo gozo de morrer e sentir a vida em seus instantes.

Não era final de semana ou um longo início de ano. Era apenas uma quarta-feira perdida num longo e exaustivo dia. E no final apenas um encontro vazio e sem sentido algum. Sem nenhum sentimento. Sem nenhuma lembrança. Apenas vazio.

E o portão fechado. Depois trancado, sem ruídos. Sem abraços de despedidas. Beijos eloquentes. Sem paixão ou aperto no coração. Sem afeto ou expressão. O amor contaminado e esquecido. E a vida niilista. Vazia.

**SINGULAR**

A tarde ofuscava os olhares, e neles os pedestres atravessavam exaustivamente sobre suas faixas pálidas e robustas.

As roupas coloridas e extravagantes. Os ternos delicados. Nas passarelas as flores naturais e superficiais. O verde esplêndido do gramado. Das praças rebuscadas. O jardim do Éden em etiquetas quadriculadas. Banalidades das compras.

As lojas de Pet. Berçários vazios. O ventre no deserto. As migalhas de afeto. O pedaço de bolo na geladeira. As comemorações da semana passada. A roupa ainda com o cheiro da loja. O sapato com a etiqueta. O encontro em desfile de diplomas. Diplomacias de indigentes, valorizados por suas empresas, com suas estampas nos crachás automáticos da vida ausente.

**Sintomas do vazio**

Demências. Os corpos mastigados, triturado como bolinhos fritos e picantes, saboreados pelos outros. E tantos outros em exposição. Ah, o museu mostrava olhares. Dilacerantes. Esculturas vivas. E mortos contemplavam em silêncio amargo e gasto.

As umbrelas no mês de abril. Nada natural. Dezembro em abril. O mês foi inundado por águas. Dilemas. Privações. Canções românticas tocavam na rádio e os jovens dançavam nus sobre os picadeiros da vida.

Os pensamentos atravessam as cortinas, transitam nos afazeres domésticos. Precipitam sobre os encontros. E depois o álcool confrontando nossos pesadelos mais singular.

O olhar era de afeto e compreensão. As mulheres sobre a mesa tagarelavam imensamente. As crianças corriam. Eram livres. E sorriam. Viviam. Olhavam o espaço e pulavam suas imperfeições.

A Bíblia é muito sangrenta. Igual a noticiários policiais televisivos. E milhões caíram. Milhões foram derrotados. Apenas um locutor transmitindo a transparência humana.

Meu vizinho soltou seus cachorros na rua, junto com outros amigos se tornaram síndicos. Uma cena linda de se ver. E logo depois da chuva, o frio, um espetáculo triste e angustiante.

Nessas retinas de almas cristalinas notamos os instantes da vida. E transmitimos gestos fraternos. O amor ficou preso no estacionamento depois de um longo dia de compras, objetos, parcelas, embrulhos e vidraças enfeitadas.

A noite cobriu o estacionamento e as embalagens ficaram expostas no sofá da sala, próximo ao copo vazio

**Parágrafo**

Os garis ainda continuam recolhendo o lixo. O cansaço apenas momentâneo. Frágil. O cheiro amortecendo a vida febril e indigesta. Percorrendo as ruas. E depois caminhar sobre o asfalto em corridas esporádicas. Os encontros são momentâneos, superficiais e barulhentos.

        No final de semana nossos pesadelos tomam formas humanas. Tanto álcool consumido rapidamente. Sábado. Domingo. Depois mais uma semana inteira para conversar com o silêncio profundo e depressivo. Vozes, ruídos e mentiras falsas. Vadias. Vírus promíscuos. O rosto pálido. Fraco. Mórbido em sombras de maquiagens cada vez mais profundas e duradouras.

        A imagem perfeita. Na marca mais autêntica. Tantos antibióticos. Remédios para o estômago. Úlceras estomacais. Cólicas abdominais. Drinks de histeria. O brilho sobre a blusa. A alma desbotada e pálida. O gosto azedo. A boca estéril. O corpo magro. O pirulito doce. As palavras vazias junto aos corpos reluzentes.

        Vidas binárias. A obesidade mórbida. As filas infinitas nos supermercados. Vacinas gratuitas nos postos de saúde.

**O amor**

Ainda sinto sua respiração, seu corpo, sua boca. Tão intensa, humana. O brilho do destino rotulado em plantões e formulários.

Novelas grotescas demais para se mensurar. Amar, meu Deus, amar.

 Lembrar dos instantes, de seu rosto. Do meu coração batendo apressado.

Por um instante não ser vazio. Um mísero minuto apagando uma eternidade banal. Somente por um minuto abrir o peito e deixar entrar toda a vida. O amor em centelhas amaldiçoando tudo ao redor. VIVER!

Apenas por um instante pensar que tudo vale a pena. E depois novamente o princípio. Você foi embora tão afetuosamente e no meu peito a lembrança me afasta dos precipícios que eu gostaria de pular.

Um minuto e o amor alastrou por todo o corpo, adormecendo a mente. E fazendo a tristeza sorrir. Apesar da face ainda permanecer olhando o abismo. Meu amor foi muito maior que minha dor. O carinho e a compreensão foram muito maiores que as quedas dos precipícios. E a escuridão que se abateu sobre minha alma foi muito maior que as noites carregas de estrelas.

O niilismo foi muito mais intenso que os gritos sobre os paredões do abismo. Enfim, sobre o céu de fevereiro a alma leve e adocicada morreu sobre as margens do abismo, na ilusão dos sentimentos, aprisionados pela decência e compaixão da vida. Sem lágrimas, sem os abraços de afetos, apenas o olhar para a loucura desenhada nas paredes do sétimo andar.

Um pulo com o olhar retido. E um corpo caído, perdido na sua agonia de se viver. Um fim sem inícios. Apenas o momento eterno da única dor de não se ter sido amada ou  compreendida.

E no final… apenas um corpo na calçada do prédio dourado da avenida das petúnias.

    Primavera de Oliveira.

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