O Niilista

O NIILISTA (Primavera De Oliveira)

Nem sempre compreendemos as novelas e todas as suas atmosferas grotescas. Saber ser borboleta nos dias de tempestades. No final do dia ressurgir em primaveras. O niilismo de nossos dias sufocados em paisagens febris. Amamos o acaso, esse nada vazio e cruel que corta nossa carne. Sempre recomeços, reinícios ridículos, e no final, quem sabe amar.

Caminhamos sobre ponteiros, minutos, segundos e no final nem sempre respiramos. E amanhã ressurgimos do precipício igual a Sísifo e seu destino. Estamos mortos e ainda vivemos. Entre paredões, cordas sobre o pescoço, e em cima do altar cartelas de comprimidos amortecendo todos os nossos sentidos.

E depois da janela, linda e bela, a primavera sem cheiro e cor, cinza, concreto. Olhamos para cima e nele o sol apagado junto ao nosso corpo dormente, não sentimos. Estamos infinitamente mortos! Somos todos niilistas.

                               (Primavera de Oliveira)

** Era novembro**

Nessa época os fantasmas começam a tomar formas, consciências de suas transcendências. Nunca pensei que fosse passageiro e desnecessário. Novembro trazia esperanças, mas tudo foi tão perfeitamente falso, que foi poético, todo o niilismo, todas as angústias e suas inverdades. Os dias continham ponteiros e neles toda a beleza da vida que escorria em seus segundos.

Novembro e tantas inverdades apagadas nos rótulos dos produtos midiáticos, tudo faustosamente belo. Percebo apenas os minutos não vividos, porém, ávidos de serem sentidos, apreciados ao longo da vida. Mas, não! Infinitamente, não! Apenas buracos preenchidos das melhores bebidas, festas, falatórios intermináveis, beijos nunca sentidos, somente nada.

O vizinho nunca mostrou seu rosto, não sei nomes, idades, gostos, apenas existem, e como todos os outros se multiplicam sem serem percebidos. Na frente das casas, números e cores exuberantes. Nas calçadas nuas com seus cestos de lixo, nenhuma sombra, nada de árvores, de verde, de vidas. Cachorros latem pela madrugada. A noite murmura, conversa, chora, grita um ruído mórbido junto com o vento, e no final da rua parecem fantasmas da solidão trazendo notícias de desgraças após o dia não vivido.

Novembro e seus lamentos contorcidos em aplausos fracassados. O que aconteceu com a vida? As ruas estão estéreis, não existem crianças, nem bola correndo pelos arredores, tudo exalando a perfeição maldita. Nas janelas somente brilhos de seriados, entregas rápidas, portões fechados, farmácias nas madrugadas, tudo genuinamente perfeito.

** O início**

Agora começa o som da bateria, batidas, escândalos, pedaços. Ah, pedaços picados de nós mesmos. Maldições? Não! Gozamos demais por escadas. O corpo ainda febril, e a boca pálida.

Somos novelos gastos. Desembrulhados. Amamos? Não! Somos covardes. O rock amortece a vida. Desprendemos dos sentimentos. Somos merdas congelantes. Ah, seu corpo, sua boca. Sua histeria. Seu descaso. Sua raiva ruidosa. Como eu gostaria de morrer hoje.

Somente hoje. Apenas nesse instante. Porém, ponteiros. Malditos ponteiros. Comprimidos. Álcool. Doce álcool. Bebidas dos deuses.

Ainda continuo querendo gozar em seu altar. E dar gargalhadas alucinantes. Seria a melhor música. E no final eu gozaria perdidamente, até perder todos os meus sentidos.

Não tenho nenhum túmulo para profanar. Somente a minha vida. Quero todos os gostos, sabores, pecados, carne e sexo. Sem palcos por favor. Sem selfie, nem mensagens. Telegramas modernos. Que piada. Insanidades urbanas.

Corredores de táxi. Condomínios. Que piada. Tudo igual. Amor igual. Sexo moderno, corpos salientes, bufantes. Dou risadas. Vidas cambaleantes, desprezíveis.

Mundo moderno. Sociologia moderna. Burocratas. Política. Vômitos em embalagens transparentes.

Rótulos, calorias, estrias, silicone. Vou vomitar. Ozônio, injeções. Vidas estéreis. Humanidade esterilizada. Higienizada. Acho que quero a vida dos cortiços do início do século XX. O início dessa industrialização cambaleante.

Morremos ao nascer. Pulseiras de identificação. Código de barra, carteira de vacinação. Vejo você! Sozinho e sorrindo. Lendo ou transando. Não importa, morreríamos se nos compreendêssemos. Nossa genética é ruim. Temos defeitos. Sofremos. E no meio desse caos histérico só penso em gozar. Com um terço na mão.

Você grita tanto. Que canção absurda. Impossível calar a vida. Vivemos? O que aconteceu com nós dois. Desistimos?!  Pelo amor de Deus, desligue essa máquina. Quero poder chorar.  Não consigo. Preciso de álcool. Estou desidratada e sem lágrimas.

** Novamente Nada**

Trincheiras modernas, ratos, lama, cadáveres em plásticos. Embalagens coloridas, vibrantes em vidas apagadas, sombrias.

Tudo tão moderno e caótico, vísceras digitais, padrões. São essas as canções modernas, verdadeiras sinfonias do paraíso.

Emagrecer.

Criar músculos.

Gritar na solidão.

Pesos, medidas, ração, anabolizantes, bêbados. Novamente a extrema pobreza volta junto com a crise de superprodução. Narcisismo, nazismo, lindo, lindo. Niilistas.

Lindo!

Sorrisos de porcelana, nariz de Michel Jackson. Guitarras silenciosas. Secas, enchentes, psiquiatras, remédios, anabolizantes.

Sexo e cafeína.

Lindo! Tudo tão belo e nocivo.

Formol! Leitões paridos.

Detesto as pessoas ponderadas, iguais, ponteiros digitais, sem sinal de vida, mórbido, apático, niilistas desprezíveis. Vejo você tão belo, perfeito, em suas neuroses, tanta filosofia, história, poesia, e nem mesmo sabe o motivo de toda essa histeria. Agoniza em seus prontuários, plantões, viagens nocivas. Tédio. Tentar matar o tempo. Tentar entender o tempo. E no final correr contra o tempo. Depois olhar a humanidade, o espelho, a face, o vazio, a solidão e se perder na agonia moderna. Depois rezar, crente moderno. Crente em correntes e balas.

        Novamente nada, você não acredita, tenta inutilmente ler todos os livros do mundo, e no final beija a ignorância vazia e supérflua. Meu Deus, que vazio. É preferível a morte do que a companhia imbecilizada e apática. Histerias, neuroses. Corredores desprendidos sem amor ou vidas. Sentimentos ausentes.

É necessário espancar a vida. Até o corpo adormecer. Só assim para sentir a vida. Esmagar a carne até a exaustão. Sufocar o vazio, o niilismo, e desprender do precipício. Vejo você em mim.  E quanto te olho me vejo totalmente perdida. O que fizemos? Será que tentamos mesmo viver!?

Queria tanto abraçar o seu corpo, sua alma, seus pensamentos, seus instantes, sua face sombria e amarga. Pecamos demais. Amamos a dor. Só assim sentimos a vida. A alegria vira comédia apavorante. Acredito apenas na solidão, é ela quem dirigi os ponteiros. E a primavera é rápida demais para segurar a alegria, no final as mudanças das estações nos mostram nossa decadência. Nossa face sendo desfolhadas, e depois o barulho das pisadas esmagando tudo que foi tão vívido.

Pausas, pausa, essas malditas pausas que nos mostram o tempo sendo escaldado ainda vivo, seu grito de horror, seus apelos, e no final ninguém percebe. Ninguém olha, todos passam como portas de vidros limpas que deslizam facilmente a cada movimento.

**Prisão Moderna**

O álcool amortece a vida. Os sentidos. Na esfera ingrata, o mau. O mal humor.  O ventre, a carne ingrata.  Santos ou demônios. Infanticídio, ruinas de nós mesmos. Solidão.

Tormentos de uma vida banida. Somente uma longa espera. Muitas vidas, uma única vida.

O inverno… A Primavera… O encontro amaldiçoado dos tempos. Uma longa espera aguardando minha ruína. Eu vejo você! Eu me vejo! Meu tormento! Meu carrasco, minha psicose, minha maldição. Monstros! Você bem sabe o seu rosto! Mentiras! Traições! Soberbo! Anjo do mau! Mil anos não destronam sua face. Perverso! Meu Deus, sou ele, ou eu!

Calígula! Todos tinham seus propósitos! Sua ira! O amor em tormento! Em sangue. Quente! A continuação de uma descendência. Nada é por acaso! Procuramos nossos torturadores.

Uma vida em ruína. Em prantos. Em solidão. Somente ciclos de torturas, entre primaveras, outonos, o inverno sempre chega e suprime. Tudo é apagado. Em transe! Sublime! Perfeito!

O outono ….

Tudo negro em folhas.

Folhas picadas…

Vermelho… Roxo… Sangue…

Não! Apenas tormento de uma mente insana.

Eu!  Você! Nós dois! Perdidos! Amaldiçoados!

Você? Não sei!? Mentira? Sim! Somente!

Acabei em bifurcações. Um amor inesperado. Vejo o passado e nossos desencontros. Não compreendo. Você ainda se guarda. Estabelece fronteiras. Semente seca sem cria.

Deficiente! Desprezível! Sedutor solitário, aparentemente depressivo. Mas, apenas crueldade em seus atos. Carnívoro. Face do mau. Sombrio. Lunático! Em rosto angelical.

Nunca esperei menos que isso.

Eu te vejo!

Correspondências corrompidas.

Muito humano. Pequeno humano.

Desumano.

Os passos noturnos.

Seriados prolongados.

Vidas arruinadas, somente horas.

Exatos expedientes.

Sem libertações, apenas a morte desfiguraria seus sentidos.

Perdão, jamais irei te alcançar.

Fico feliz no caminho que hoje percorro.  Abandonei você com um singelo sorriso. Nada mais vai poder restaurar nossos infernos. Ruínas! Doces ruínas! Doce morte! Doce solidão!

Vejo você!   Tão distante!

Sozinho e estéril, somente só, amargo e esquecido. Na loucura da sua infinita alucinação. Nenhuma droga amenizará o fim.

Suicídio?

Não!

Ainda não! O fim é o seu recomeço. Amargo, desesperado, sombrio, vazio. Droga! Esse vazio é pior! Emblemático!

Dou risadas.  Catarse.  Dou gargalhadas. Vazio. Niilismo, nada.

Nada, nada, nada …

Você nunca deslumbrou nada além do nada. Tão sincero e mentiroso. Desfigurado. Alma corrompida, Blasfêmia. Inquisição, Destino, vida, insurreição. Mórbido. Poético, romântico.  Trágico. Belo.

Amar você?

Não!

Apenas transformar minhas palavras em poesia, nada vigora em seu coração. Doentio? Não sei. Acredito em remissão.  Tão católico.

Muito excêntrico. Pouco aceito. Desprezível. Autêntico. Luxúria. Tentador. Sedutor. Gozaria no altar de Deus. Com toda a minha alma. Meu Deus, como eu gozaria. Até não conseguir mais ter nenhuma lucidez.

Muito católico. Muito cristão. Como eu gozaria! Ah, tão poético.

Muito cristão. Extremamente evangelizador. Apenas um sussurro. E gozo. E gosto.

Vejo você, meu inverno dormente. Forte. Alucinante. Apenas uma briga com minha consciência.

Não te aceito!

Recuso.

Quero muito mais que um inverno dormente.

Quero amar. Quero sentir o sol, a vida, o amor, a dor, você. Ah, quero tanto. Espero tanto, busco tanto. Somente minha dor. Uma chave para a vida. Você! Sem chave. Apenas o fim seria sua libertação.  Mas, tão preso em você mesmo. Paranóico. Doente terminal.

Vísceras expostas em anglos midiáticos. Em rostos felizes.

Que bom que nosso fim, não foi nosso início.  Começamos no final de nossa tragédia.  Muito humano.  Em cada estação de ano, vejo você tão perdido. Momentos, instantes. Apenas instantes. Nada será duradouro. 

Nada!

Nem mesmo o riso.

O semblante gasto.

Pare de magoar os outros em seu covil. Aceite seu túmulo. Sua vida, sua miséria, sua covardia. Liberte as almas frescas que sonham.

Você não tem mais sonhos, nem esperança. Morreu em você mesmo. Pare de aprisionar a sua loucura. Estou em transe. Alucinações em ruínas. Pedras contidas. Vidas arruinadas. Massacradas, transformadas em caos. Explosões gigantescas. Minúsculas, profundas e insanas.

**O cansaço**

O fim. A espera. O fim. Chega! O ciclo insuportável da vida.  Nossas escolhas, sem escolhas.  Prisões. Constelações. Vazio. O vazio que liberta e aprisiona. Tão lindo! Tão poético. Lindo! Muito amor para uma única vida. Não cabe. Não ajusta. Não aceita.  Não presume. Vive!

Sou muito mais que eu mesma. Quero tudo, e apenas o sombrio dia enlouquecido de uma tarde fria. Capatazes, torturadores, atrozes, oficiais, manchas adormecidas. Das cicatrizes das meretrizes. Passados indigesto. Lindo! Poético. Hoje, apenas o transformar do dia em horas, blasfêmia.

Quero a igreja e seus inquisidores.  Quero o pasto, a água, os disseminadores das doutrinas. Quero as moedas tilintando nas alcovas.

Sem álcool. Quero lágrimas. Quero dor. Quero amor. Quero amar. Quero o vazio. A solidão. E você. Somente você em sua loucura. Sua morbidez, sua doença. Seu câncer midiático. Suas profanações.

Sem purgatório, por favor. Estou cansada, exausta. Sem culpas. Nada. Sem remorsos. Nada. Apenas me olhe. Veja. Sinta, olhe.  Amo tudo isso. Não espero nada.

 ** Reinício**

        Não pedimos início, reinícios, partidas de futebol, jogos de azar, horóscopos modernos. Não pedimos nada. Mas, sempre as estações, os ponteiros da indústria, os semáforos sincronizados. Faixa de pedestres, fiscalizações, carros coloridos, penteados da moda, correios e pontos eletrônicos. Reiniciar, quando nada está dando certo. Iniciar tudo novamente. A mesma síndrome romântica, os mesmos sonhos estonteantes. Da vontade de vomitar.

E de repente, do nada a canção voltou. O amor voltou. Agora ouço músicas alucinantes, Canções histéricas me aguardam.

E o niilista? Tão morto, doente, insano. Talvez ele seja eu.

Talvez!?

Tenho medo de não conseguir desfazer das minhas horas. Pobre alma castigada em planos, diários, temáticas bucólicas. Acredito que me perdi naqueles anos juvenis.

Eu amava.

Eu cantava.

Eu dança.

Eu sonhava.

Hoje, escravidão do tempo. Do niilismo. Da insanidade. Da pobreza de se amar. Somos escravos. Contabilizamos correntes.

 Tomamos antidepressivos.

Ainda vivos, vivemos, trafegamos. Pagamos videntes, horóscopos e mapas astral. Trágico mundo moderno. Caótico diria.

De repente do nada me vi em afetos. Meu Deus, como um toque muda o mundo, a alma. Morremos! Estamos mortos! Somos relógios, ponteiros, segundos, vertigens.

Tragédias!

De repente um barulho. Acidentes, muros, buracos. Um pneu furado, um corpo ensanguentado. Ataduras, esparadrapos. E nesse momento respiramos. Como é bom respirar sem ponteiros, horários.

E nessa pausa percebemos o afeto.

O gesto.

A mecânica.

A vida.

Os sentidos.

Nosso propósito.

Ah, o amor.

E no final, vazio.

Sabemos reiniciar. Sempre reiniciar. Reiniciar o outono, a primavera, o verão escaldante, o inverno infernal. Depois encontramos novamente belezas, recomeços. Lindas histórias. E no final tragamos as melhores bebidas preenchendo o nosso vazio. Somos copos rasos. Vivemos vidas rasas, insignificantes. Buscamos aprovações, olhares majestosos, penteamos nossos sorrisos, vestimos roupas de cores berrantes e depois calamos a vida. A vida sem berros, sem voz, apática, vazia e niilista.

**Mídias**

Você saiu da mídia, das novelas. Dou risadas. Era apenas euforia. Já passei tanto por isso. Quando achamos que seremos felizes, e nada. Vazio. Niilismo. Misérias congelantes.

Sua soberba, damos risadas. Livreto aberto. Banca de revista, baratinho, quase de graça. Leitura improvisada, rápida. Sem aprofundamento. Sem ressentimentos. Nada em você é profundo.

Vive insanidades.

Somos ponteiros de um relógio lunático. Percebemos as engrenagens, o sofrimento, a dor. Você reloginho digital de Pokémon. Niilista.

Talvez, todos nós somos instantâneos.  Niilistas em rede.

** Sábado**

Ah, hoje eu quero falar dele. Simpático, voraz. Alucinante, vibra a vida. Nada é importante ao redor. Despreza o vazio. Os rótulos.

Variações da vida.

Você percebe as inutilidades padronizadas. Não aguarda nada! Não sonha ou idealiza. Vive! Distante dos niilismos modernos. Estou te olhando, ainda não vejo.

Percebo.

Você irradia o verão. Tão forte. Tão emblemático. Whisky, rock, solidão e desejo. Você absurdamente perfeito. Loucamente insano.

Provocativo.

Morreria em sua boca. Arranharia sua carne. E abraçaria sua alma. Pecaminoso. Profano. Vive intensamente. Sem arrependimentos. Busco constantemente sua boca.

E os ponteiros nem mesmo lembro. Apenas, o relógio. Nada marcado. Em alguns instantes acredito que tudo seja apenas isso. Mas, depois os ponteiros começam. E eu lembro que tenho que continuar.

Continuar a ser solidão. Amar o niilismo dos dias. Marcar as horas. Os intervalos. Tantas batidas. Gráficos. Chamada. Eu quero viver!

Queria ter tempo. Eu sei amar.

Não preciso de remédios, novelas, mídias, selfies, silicones. Eu sei amar. Mas, de novo os ponteiros. Malditos traços. Malditos panfletos, promoções.

Cremes, viagens. Ah, eu vou enlouquecer. E você! Tão distantes de tudo isso. Talvez, o rock amorteça a alma. O som distancie a ignorância suprema.

Amo você. Seus pesadelos. Sua história. Não existe recomeços. Você foi sem dizer nenhuma palavra. E agora a lembrança. Os ponteiros nunca foram mais que músicas para você. Como não iria amá-lo. Meu doce desencontro que encontro. E amanhã? Estarei pensando em você!

** A porta de vidro **

Estava sentado me olhando profundamente. Nunca disse nenhuma palavra. Talvez a filosofia fosse maior que você mesmo. Não ousou dizer, silenciou eternamente.

Tantos demônios que ajoelhei para sua alma. Não importo com seus monstros. Nem mesmo aguardo doçura ou prazer. Descaso, vida pálida e sombria.

Poderia ter sido apenas uma simples conversa. Mas terminou em ponderações.  Malditos ponteiros, odeio todos eles, romanos, digitais, nada importa, eles giram. Matam em segundos o não vivido.

Desistir?

Talvez!?

Não posso. Não quero. Mais uma vez, e outra vez. E todas as outras necessárias. Meu coração sangra. Estou em febre, convulsões. Odeio essa vida, seus ponteiros e todas as ponderações.

Gosto de palavrões, sexo, madrugadas, esquecer dos ponteiros. Malditos ponteiros. Maldito relógio. Maldita consciência que me apaga.

Tenho que continuar caminhando sobre os ponteiros. Sobre o vazio, o álcool, a febre, carrinhos de supermercado. Compras virtuais, moda, trepar até o amanhecer. Depois o desatino, a ilusão, vazio, e nada, nada mais.

Percebo sua face tão emblemática.  Você e seus monstros, desesperança. Tanta filosofia que ficou belo. Acalmar todos os monstros contidos na sua alma.  Bárbaro! Dilemas urbanas. Sangrar ou estancar a vida. Conter ou matar!  Sem esperanças.

Apenas mais um dia da semana. Deveres do ofício. Balas, cansaço, alucinações. Desistir de tudo. Recomeçar sem querer. Novamente buscar o vazio.

Desenhei uma ampulheta no meu braço. A areia escorre pelas minhas veias, as flores ao lado escureceram. Depois sinto o meu braço girar em círculos caóticos. Fico sentido a areia escorrendo nas minhas veias. Limpando minhas artérias, tudo notadamente desigual, pálido e concreto. Sinto até mesmo o peso sobre minha carne.

**Corpo**

Não sei se ele sentiu meu coração disparado. Estava praticamente escrito no meu rosto, sobre minha face, seu nome. Meus pensamentos, meus poros, minha carne, minha respiração. Tudo estava em você. Olhei depois seu corpo cansado, suado, a voz rouca, parado, descansando, respirando.

Sempre chegou atrasado. Sempre notei. Sempre olhei. Estranho. O que aconteceu. Alguns sábados, outros ausente. E no final, depois que levantou do banco, atravessou a porta de vidro, e então, eu nunca mais o vi.

Fiquei com a ausência, o vazio, o niilismo, o grito contido. Maldições desses ponteiros malditos. Viagens, cansaço, ausência, belezas amargas. Esses ponteiros insistem em me matar. O rosto no espelho, a exaustão do dia, e no final apenas sua lembrança.

Atravessou a porta de vidro levando todos os cadeados. Os monstros me martirizam. Vejo a vida com tanta beleza. Qual a sua filosofia? Por que tanta violência contida? Correr até o deserto deve ser mesmo um tédio sufocante, mente presas em correntes.

Os braços pisados e o corpo ainda cambaleante, suplica vidas, reinícios, febres de um corpo exposto ao sol. Dormências. E no final o tempo parece engolir tudo. Não existe tempo para amar. Não existe tempo para acreditar. Existem apenas minutos, distribuídos em ponteiros. O carrasco faz tic-tac, tic-tac. Sobra apenas o corpo cansado no final do dia, e o que poderia ter sido se não houvessem esses ponteiros malditos.

A esperança luta bravamente, mas os ponteiros não param nem um segundo. Nada, nada, vazio e mais vazios, preenchidos nas melhores bebidas. Amortecemos a vida com o passar das horas. Mas, novamente a lembranças aparece entre seus ponteiros. Torturas, o peito dolorido, pesado, a respiração lenta e sufocante. E no final apenas sua imagem sobre a aquela porta de vidro e as escadas infinitas.

** O reencontro **

Esperei as semanas se diluírem no arcabouço da loucura. Esperei sua presença e uma única palavra, os gestos não eram mais necessários. Apenas uma letra. Caminhos encobertos. E agora?

Espasmos, tuberculoses, câncer, água em Marte. Soldados marchando em montanhas. O cinema estava lotado e eu não vi o seu rosto. As filas sumiram depois que minha cabeça sufocou.

Apertei a tecla e apaguei todas as palavras.

Fim. Começo. Reinício. Agora. Corpo. Novembro. Coloquei todos os títulos de início, fim, reinício. Tudo que me fazia lembrar de você, busquei. Por entre as palavras, apenas senti solidão. Novamente o vazio infinito e supérfluo.

Nunca pensei em desistir, sumir, vivenciar o caótico da vida. Foram caminhos trilhados com tantas bifurcações. Um passado indigesto, efêmero, estrangeiro, nunca me apeguei a ele. O presente sempre foi vivido e o futuro totalmente incerto. Somente reinício nos meus caminhos, nos meus amores. Partos demorados, contrações abortivas, amizades ruidosas, desenganos, vidas sombrias.

Tanta luz e tão pouca luz. Um inferno ruidoso e meticuloso. Muita escuridão para uma única criança. Solidão. A vida em uma tela meticulosa. E os meus olhares percorriam suas cenas. Apreciei todas e nunca vivi nenhuma. Apenas um sonho demorado. Nada que acrescentasse vida. Tudo ilusório e caótico. Vejo apenas ponteiros que foram alterados no decorrer do destino, dos dias.

Dramas modernos. Pegadas viciadas. Descaso. Alucinações, tudo vivido em minutos. Sem descanso, dias e mais dias, novamente os acidentes, os amores em esquina, num minuto, dentro de um ponteiro, milésimos de segundos, lampejos da vida. Sempre foi assim. Desconheço outras maneiras. Simplesmente, de repente olhamos.

E dessa vez você estava lá, parado, emblemático, foi apenas um breve piscar, e depois tudo ficou confuso, assustador. Não conheço sermões, nunca olhei para trás, sempre em frente. Agora nesse instante, parei, respirei, e então, olhei. E vi tanta doçura e tantos demônios.

** Pensamentos **

Dessa vez não mais.  Os ponteiros não faziam mais sentidos.  Não preocupava mais se eles estavam girando. Pensei apenas que dessa vez, não. Simplesmente não.

As horas consumiam meus dias. O niilismo se tornou meu amante inigualável. Agora era minha companhia. Sem cobranças ou falsas esperanças.

Tudo tão simples. Como um mormaço do final da tarde. E com o corpo ainda dormente, tentamos levantar. Erguer os passos.

Caminhar. Mas, não! Simplesmente aceitamos. Deixamos nos consumir de vazio. De nada. Sem esperanças. Sem amor, sem encantos.

Apenas a tranquilidade do nada. Do vazio. Da solidão preenchendo todos os cantos. Todos os poros, toda a alma. Tudo tão belo e suave.

Mas, não! Você simplesmente surgiu. Me tirou a paz. A calma. O sossego. Agora saía do paraíso niilista. Os dias começavam novamente em ponteiros. Me mostrava o tempo. E tudo aquilo que eu não tinha vivido.

Me tirou da poltrona da sala, sem novelas. Sem comprimidos para amortecer a vida. Agora sentia meu peito pesado novamente. A angústia. A ausência.  Sem niilismo. Sem encantos. Tudo caótico.

** A distância **

O desprezo por tudo, a distância consumindo tudo. Tentando não pensar, nem entender, muito menos refletir. Apenas parar e deixar os ponteiros seguir em seu ritmo.

Até que tudo acabe. Tudo transforme. Tudo mude, e tudo permaneça do mesmo jeito. As estações sempre alcançam a primavera. E depois não importa. Novamente ela voltará. Tudo voltará a florir.

As flores no final acabam vencendo. A dor não é soberana. Mas, os ponteiros. Esses malditos! Sempre iguais. Sempre juntos. Sempre autoritários. Sempre presente.

No final eu sei que vai parar. E tudo permanecerá do mesmo jeito. Enquanto estiverem rodando, terei vida. Viverei intensamente. Ah, malditos ponteiros! Nem mesmo posso acompanha-los. Tenho que esperar o momento certo.

Malditas ponderações, regras, etiquetas, teatros. Bebemos um cálice e nos transformamos. Depois pedimos desculpas incansavelmente.

**Alucinações!**

Era o presente de final de ano, simplesmente apareceu do nada, caótico em silêncio apavorante. Não compreendi no início, apenas olhei, mas não vi, não senti. Mas, ele sim. Me devorou a cada segundo, do seu jeito, em silêncio, na espreita, no pisar das horas.

Me senti nua, transformada, tudo girava e eu não sabia com sair, como fugir. Apenas, ponderei. Tentei esquecer, apagar aquela lembrança. Porém, fracassos, e mais ainda ele ganhava. Depois ficou ausente, distante, com seus olhos em chamas, desapareceu.

Fiquei em silêncio profundo com uma imensa vontade de gritar, poder arranhar o peito até sangrar a carne, talvez assim a dor passasse. Mas, não! Era mês de primavera, não pude ficar ausente. Tive que me manifestar. O mês ainda estava seco, as chuvas ainda estavam por vir. A pele seca, a boca seca, o corpo seco, a alma trincada, o coração em poeiras.

Não tive escolhas, ofertei toda a minha epiderme. Não, não importava mais nada. Não queria conter e nem mesmo existir. Mas, não podia desaparecer, tinha que continuar sendo. Dia após dia sendo, vivendo. Era o mês da primavera e dessa vez eu não queria ver as flores, nada, nem as chuvas, muitos menos cores e parques.

Das minhas mãos nenhuma gota de água elas sentiriam. Por mim suas folhas poderiam ficar secas, caídas, até morrem passivamente, beijando o chão. Mas, eu sei que depois elas retornam junto com as chuvas. Elas são fortes. Imensamente fortes e delicadas. O muro de concreto sucumbi com o tempo, as trepadeiras, e juntos com elas as flores. Malditos ponteiros, no final eles ganham.

**Setembro**

Os noticiários desfilam tanto ódio, a vida vai ficando mais apática e sem graça. Amanhã a rotina, depois de amanhã o marasmo, e novamente a apatia e o cansaço maldito. A única coisa que refresca a vida são as lembranças da sua ausência. Sem pecados, somos todos niilistas soberbos e amaldiçoados.

A música acalma, mas é necessário a bebida, o acaso, o sexo gasto. Depois somente ponteiros e vazio, perda, essências profanas. Misérias em enlatados, restos de bebidas, copos imundos, vida impura, estamos todos condenados a essas infinitas repetições.

O muro do vizinho é de concreto, o portão da minha sala é de vidro e reflete o muro de concreto. A vida de concreto, o beijo condensado e amargo, sem gosto, cheio de piadas. Tudo de uma ilusão magnifica, belo, vidas decoradas, cheias de papel picado, festejando a vida. Os encontros, os amores, todos podres e soberbos.

Sua lembrança suaviza isso tudo. Amacia o concreto. Seu beijo deve comtemplar as estrelas. A noite seria eterna. Mas, depois recomeços, inícios infinitos e tudo terminando em outonos e primaveras, ciclos, retornos. Isso tudo enche, enlouquece os sentidos. O clube de boxe suaviza. A dor apaga a miopia. Revela a vida. O sangue. O cansaço.

Odeio esse mês. A primavera está próxima, mas sinto apenas vento, poeira, chão trincado, flores mortas. Passarinhos ausentes, sem calma, nem barulhos. Tudo tão lindamente seco. Os vizinhos levaram as crianças para a casa da avó, sem nenhum barulho. Um silêncio absurdo canta atrás do muro. Tudo perfeito e em harmonia. Como a vida escorre pelo ralo, nem precisa de ponteiros, relógios, ampulhetas. Tudo, tudo, tudo lindamente perfeito, sem rumo, bússolas ou compromissos. Apenas hoje, perfeito e belo.

O inverno está indo embora. Não deveria. Pecado! Pecado ele ir tão cedo dessa vez. Poderia ficar, abrigar meu coração. Congelar até fragmentar em pequenos pedaços para nunca mais ser restaurado. Nunca mais! Nevemore! Não agora! Nuca mais!

**Esperança**

De fato, o inverno está indo embora, tão audacioso e frio, meticuloso. Agora espero apenas o tempo cumprir seu ciclo. Essas intermináveis esperanças. Pandora, tudo deveria ter sido libertado. O que ficou amortecendo a vida? Esperança! Tão trágico! Desumano! Cala a vida, os sentimentos. Restando apenas a espera execrável, mórbida, doentia. Adormecer a vida, nada mais.

Sem chances.

Sem nada.

Niilismo.

Talvez, tivesse começado tudo na infância. O silêncio. O infinito. As chuvas. As transmissões de rádio. O vento. As árvores. O vazio. O descaso. O nada.

O banco no final do corredor refletia a vida, as discussões, as novelas intermináveis. O dia nem mesmo tinha ponteiros. Apenas as estações da chuva, depois o sol, novamente a chuva. Depois estrelas, constelações infinitas. O ruído do gato. O buraco imenso.

Não precisava dela, a esperança. Era desnecessária. Hoje ela se apresenta tão cara com a face desgastada, nem mesmo sorrir ou levanta o olhar. Sublimemente despida com o tempo.

Nas épocas de chuvas ocorriam avalanches. Lembro de todas. Hoje, seca, inverno, irrigações, morfina, botulina, programas, sites, espermas, cantos desafinados. Lábios plastificados. Não quero o passado, nem o presente. Nem a esperança. Apenas a sua lembrança conforta.

Balas, carregadas de precisão. Fantasmas e tantos demônios. Parece triste e sombrio. Desanimado. Sem ilusões. Perdido. Falsamente perdido. Distante. Sinto muito não poder alcançar todos os demônios.  A esperança me derrubou. Ela conforta, desanima, tira o que temos de melhor que é saber que não vale a pena.

Ela deprime, faz ter sonhos. Enganos.

Corrosiva.  Ela amortece nossos sentidos. Não deixa a corda presa no pescoço. Ela consome nossa consciência.  Vicia. Todos os dias tomamos um cálice. Depois continuamos. No outro dia tudo novamente. Até entupirmos de comprimidos. Vestimos as cores da esperança. Sorrimos, mentimos, cambaleamos. E depois passamos o cartão de crédito.

**Pesadelos**

Ligamos o ar condicionado ao máximo. Nem mesmo percebemos o brilho do sol lá fora. Mais uma série terminada. Depois jogos, pizza, amigos em rede, na rede. Em novelos coloridos, em pratos giratórios.

Depois a pausa, num bar em um quarto barato, no final do corredor, nos cultos de terça-feira. Comprimidos, pílulas, xarope, absinto. E por um momento a vida pulsa lindamente. No outro dia náuseas. Ligamos a televisão e amortecemos nossa carne. Pausa. Respiramos.

**Semáforos**

O som ligado no último volume. A presença da sirene. O bailarino debaixo do semáforo. A velha maldita atravessando a rua. O cachorro deitado ao lado.  Vitrines coloridas. Vitrines de pessoas vivas. Pessoas mortas andando. Pessoas vivas refletidas nas vidraças.

Novamente a sirene. Os carros nos acostamentos. O ciclista navegante. Somente adultos nos caminhos. Não existem mais crianças nas ruas. Apenas animais domésticos. Pet shop, pet, gostos, cores, sentimentos, ong’s.

De novo a sirene, os radares, as faixas, os outdoors luminosos. Chopp na esquina. Pontos estratégicos de travestis. Olhares desavisados. Lindos semáforos, lindas as árvores podadas em silhuetas perfeitas. As calçadas elevadas. Os portões simétricos e metálicos. Perfeitamente belos. Casas suntuosas, ordeiras e cheias de vidas mecânicas.

A vida debaixo de um semáforo. Os rios poluídos. Os noticiários falsos. As escolas presídios. Os presídios escola. Os professores penitenciários. A polícia humanitária. Meu Deus, caótico. Inflamações de vidas. Niilismo, vazio, nada, apatia, merda, caos, cirurgias plásticas, academias, corpos musculosos e estéreis.

Vitrines modernas!

Pílulas anti-suicído. Suicídio coletivo. Novamente a histeria. O “bem-estar” cerebral.   Suicídio infantil. Pedofilia, zoofilia, pornografia. Vidas em academias. Bullying, pop star, vidas deslumbrantes viciadas em heroína. Vidas cinematográficas.

Nada pessoal, são apenas vitrines. Pessoas socializam vitrines, produtos, compras, parcelamentos, embalagens. O sexo apenas uma necessidade do corpo. E a alma entorpecida de medicamentos. Os sonhos embalados. Os desejos consumidos e descartados. O prazer em capsulas e embrulhos de embalagens.

**O Niilista**

Desapareceu lindamente, deixando a dúvida e todas as suas incertezas.  Subitamente lembrava o mês de março e o findar das últimas chuvas. As ruas antigas eram feitas de paralelepípedos, todos enfileirados. Tudo caoticamente armado, triturado e moldado.

As calças eram gigantescas. Existiam assentos próximo ao portão das casas. E sobre as calçadas as pessoas andavam, ninguém corria, buzinava. Sem ambulâncias, atropelamentos, semáforos de carteira assinada e muito trocados.

Tudo em perfeita ordem. A desordem era ordeira e cheia de progresso. Hoje apenas duelos de simpatizantes, opositores, opressores, inimigos, amigos, travestis, transexual. Tanto sexo, tantas novelas. Bebidas, cervejas, bandejas e sexo. Cardápios e sexo.

Depois a conta, o troco do garçom. O moço simpático atrás do balcão. As meninas gritando histericamente no final do corredor. E então, um pouco mais de sexo. Depois outro telefone, e então, mais sexo. Terminou a noite com um novo beijo, e novamente sexo.

Acordou sem lembranças. Lavou o rosto, tomou o último café, depois desprendeu o lençol preso sobre a janela.

E ele apenas pensou que tudo era uma piada. Não, não era. Nem filmes, nem peças teatrais, era a vida niilista correndo nas veias junto aos ansiolíticos. Tudo muito belo, padronizado, na medida certa, todos os ângulos contabilizados. Todos os seios preenchidos, junto com os lábios e as sobrancelhas arqueadas.

Caoticamente belo. Vidas belas, suicídio belo, remédios na dosagem certa.  Sem frustrações preenchidas de garantias. Setembro amarelo, junto com ipês amarelos. Com a vida amarela. Com os documentos amarelos, os dentes amarelos e o coração amarelo de gorduras. Depois lipoaspiração. Silicones. Hospícios sorrindo lindamente.

Propaganda em bandas de rock, sentinelas sem sapatos. O batom em cores fortes. E o coração derretido e enlouquecido. Tudo tão bonito. Niilismo em rede. Nas capas das revistas, em bulas, entre as páginas dos livros didáticos. Tudo muito bonito e a alma apodrecida, acorrentada em lobotomia. Lembra Sin City, de Tarantino. Perfeito!

Pílulas de niilismo. Drinks niilistas, sexo niilista. Pensamento vazio. Amor niilista. Família niilista. Morte banal. Violência rotineira. Homofobia. Homo, medo, fobia, medo, homofobia.  Homem, medo, homem fobia. Aniquilamento da humanidade, niilismo. Vidas absurdas, nada, descrença, sem crenças, sem esperanças, nem vontade, nada.

No final do dia, nada. Apenas respirar lentamente. Sem sobressaltos. Fim da divindade cristã. Sem sonhos, sem esperanças. Entorpecer todas as noites, remover qualquer humanidade. Sem gritos.

**“Encontro”**

Era início de ano, esperanças, reinícios e recomeços. Não pensava em nada, não busca absolutamente nada. Foi assim, sem esperas, sonhos ou busca, ele surgiu em meio ao caos. Apareceu do nada. Como um sonho brusco. A mente sobressaltou por um instante. Recusei a aceitar.

Nesse instante desse acidente já tinha desistido e aceitado minha face niilista. Buscava nada, almejada nada, vazio. Incontingências literárias e nada mais. Mas, sua face sorriu e eu olhei.  Encontros que não deveriam ser prolongados nem mesmo amados.

O amor acontece, estabelece ditaduras, rebeliões, obsessões, tudo em perfeita harmonia. O coração acelera, as horas de insônia, o pensamento acorrentado, sendo torturado a cada minuto.

Encontrei num final de tarde, era véspera de carnaval, mas sem folia, ou histeria, foi simples, num dia de silêncio profundo. E a garganta presa, o corpo pesado e alma entristecida. Ele tinha o olhar de um louco, uma face sem expressão ou sorriso. Nada transparecia, apenas o olhar psicopático. Meu amor era lunático, de outros espaços, outros tempos, de uma galáxia escrita em filosofia, mas, cheia de cadeados.

Extensas gramáticas, pouco afeto, muito filosofia e pouco sentimento. Apenas cadeados, prisões, arbitrariedades, face do mal. Muitos pecados, e assim caminhei tomando remédios e adulterando meu sangue niilista. Duas vidas vazias, apáticas, niilistas. Pobreza.

Vivemos na extrema pobreza, não temos tempo para o vício, somos obrigadas a procurar clínicas de reabilitação. Não podemos parar os ponteiros, eles giram numa velocidade totalmente desequilibrada.

Malditos ponteiros, quero acompanhar todos esses malditos. Não aceito essa matemática, esse espaço, essa vida sem graça. Não posso parar o amor ainda não me tomou, apenas transgressões e nada mais. Sem clamor ou peito ofegante, apenas face paralisada, rosto atormentado, alma desatina, e nada mais.

As chuvas começaram, voltaram, acalmou minha alma. Não! Ainda não! Somente as tempestades, as cachoeiras, o paredão, os assaltos na madruga. É preciso de tantas tempestades para acalmar a minha alma. A tranquilidade entristece, apaga o brilho da vida, os momentos e todas as suas palavras necessárias.

Não sei em que dimensão, tráfegos ele se encontra. As músicas ouvidas, o evangelho sabatinado. Morreria em seus braços. Mas, por enquanto tenho que viver, não posso parar. Nem mesmo olhar, tudo tão rápido. Corremos incansavelmente. Apenas quando adoecemos sentimos a vida. Os ponteiros suavizam. O sol brilha. E o silêncio canta.

        Nesse momento consigo apenas ser correria, ilusão, noites em febres. Niilista. Sozinha e nada. Desprezo e agenda marcada. Noticiários, depois o micro-ondas ligado. A máquina de lavar roupas girando. A cabeça vibrando. A náusea. O transe. A perda de sentidos. A vontade de gritar e de desligar. Enfim, morrer. Terminar. Acabar. Finalizar sem reinícios.

        Mas, amanhã novamente o início. O ventilador ligado. A partida no carro. O portão fechado. O relógio preso no pulso. O coração sem vida. O sorriso falso.  O cansaço. A fadiga. A vida em migalhas. Prisões modernas. Uma volta ao hospício em escadas rolantes, vitrinas coloridas, promoções, lanches rápidos, bebida rápida. O troco do estacionamento. Comprimidos para dormir. Calar a vida. Silenciar a morte assumida. Pausa.

**Desespero**

Boletos, política, eleições, de novo a fantasia da filosofia. Ela amortece nossa vida, acalma nossos instintos, deprimi nossa barbárie. Somos selvagens, precisamos do outro, o outro, e de nós mesmos. Se não viramos animais famintos, dispersos em manadas.

No final os desejos nos aprimoram. A ética desvenda os caminhos possíveis. Conseguimos perceber o outro, os outros e todos os demais seres. Percebemos os sentimentos, sentimos.

Desejamos viver ou morrer. Ou mesmo se aventurar, correr riscos. Mundo sensível. Mundo das ideias. Mundo de ideias. Viver o outro. Pensar nos outros e em nós mesmos. Tanto desespero. Tanta angústia. Tantas misérias de nós mesmos.

Sem hóstias, agora em cartelas ansiolíticas. Sem amigos, apenas colegas de trabalho. Sem amor, apenas encontros.

Adoro isso. Famílias tradicionais. Até que enfim, morreram todos de sífilis. Feridas. Palavrões. Todos totalmente alvoraçados, perdidos, mendigando afetos. Postando imagens. Roupas coloridas.

Montagens urbanas. Marketing pessoal de vidas suburbanas. Apenas prostibulo virtuais. Gozo curtido em redes. Corpos salientes. Vidas desprezíveis. Tudo horrível e belo. Nero e seus incêndios modernos. Meu Deus, eu adoro isso, me faz sorrir.

E depois eu lembro de você. Suaviza o coração. Sua filosofia, seus demônios. Corpo pesado preso em batalhas. Depois a luta. E a solidão. O niilismo. A devassidão. E o vazio. E eu. E você. Sozinhos. Vazios. Somos niilistas.

Ontem, fui caminhar. Não existia flores nos canteiros, apenas resto de papéis jogados. Folhas adulteradas, árvores despedaçadas. Cachorros em matilhas. E pessoas arriscando as vidas nas suas rotinas miseráveis. Tudo tão caótico e belo. Tudo tão falso e belo. Casas ridiculamente pintadas de cores carnavalescas.

A mansidão do nada. Não fazer nada depois de ter feito tanto, corrido, engatinhado, exprimido, enlatado, picado e finalmente distribuído nas mídias. Tudo belo, perfeito. Traços perfeitos. As fotos em família, academias, chopp, trânsito com o cachorro de lacinho, depois mais fotos, roupas de ginástica. Amigos ao lado, sorrisos, músicas urbanas.  Pessoas belas, vidas perfeitas.

Acredito que ele sabia de tudo isso, mas preferiu não transformar, talvez precisasse disso. Não aderir à loucura é suicídio ou niilismo, nada, vazio, perda dos sentidos, morrer em vida, respirar calmamente, até que todo o oxigênio atinja os poros, as vísceras, o cérebro ficar todo amolecido, aguado, espalhado, morto, com aparelhos ligados, celulares, mundos virtuais.

Você foi embora muito cedo da minha vida, ficou saudades, rastos, férias, queria ser poesia, virei niilista. Amo alguém niilista, vazio e cheio de demônios com toque narcisista. Fiquei viva. Fragmentada, morta, esquelética, histérica, neurótica. Com sorrisos normais, tudo calmamente lindo, suave. Desesperadamente linda essa vida. Desesperadamente sufocante. Corrosiva.

**Perdão**

Tentamos sentir, amar, buscar compaixão, socializar, mas tudo em vão, epidemias de niilismo. Sem vacinas. Nossa HIV moderna, brutalmente linda. Tomamos alguns comprimidos e continuamos a viver normalmente. Smartfones, amigos, sexo, cafeína, whisky, mais sexo, depois os ponteiros, a rotina, os dias, o niilismo, as vacinas, e novamente sexo, cafeína, ansiolíticos, academias. Brutalmente belo.

Perdão, gostaria tanto de morrer e acabar com tudo isso, “amor fati”, ridículo, sífilis, mensagens, programas, bebidas, sexo, e amor diurético.

**Travessões**

Ah, tantos pontos, ponteiros. E a vida sim, depois de uma longa pausa, um travessão, um minuto de vida correndo pelas veias, sentindo, sofrendo. Despedidas. Muitas despedidas, fim, final, finais. Pelo menos dessa vez sem recomeços, sem reinícios. Ah, um travessão, uma pausa, uma respiração. Por um segundo, um sentido disso tudo.

**Fragmentos**

E quando nada restava, tudo tinha sido adulterado. Os sonhos desfragmentados. A alma corrompida. O acaso apareceu no final da tarde. A última brisa do fim.

Atravessou a porta de vidro em um manto preto maldito. A disciplina rígida, sem sorriso, sem expressões. Lindamente morto. A exaustão da vida. O precipício que não enforca. Ficou imóvel, olhando sem nenhuma gota de expressão.

Mas, por dentro o corpo estava em guerra. Os dias eram de lutas. E no grito contido ele beijou o acaso. Algo tinha mudado, queria o destino adulterado.

Apagamos todos as chamas de humanidade, as últimas faíscas de iluminismo. Matamos todos os humanistas, todos os filósofos. Ficamos sozinhos sem perguntas, questionamentos. Amanhã, o amanhã, e depois amanhã novamente. Tudo sem brilho, e na noite apenas volúpia, sexo, cafeína, prostitutas. E nos dias ensolarados, advogados, engenheiros, administradores. No cartão pessoal, o self, os links, os vídeos, os vícios.

No trânsito churrasquinhos, petiscos, assaltos, corpos desfigurados, tatuagens, cores, malabarismo. E no final da tarde você sublimemente perfeito. Tanto caos que sufocou qualquer niilismo.

Demônios modernos, Filosofia moderna. Homens modernos. Deus moderno em zoofilia, e marcas de refrigerantes. Meu Deus, tudo tão belo!

Vidas magnificamente belas. Cirurgiões de Monalisa. Cirurgiões de hospícios. Anfetaminas, heroínas perfeitas. A vida sugada em tetas.

No final da tarde você apareceu com todos os seus demônios. Um evangelizador, crente. Perfeito. Soberbo. Cheio de luxúria.

**Tempestades**

As músicas eram alucinantes, os gritos, as histerias. A psicose. O olhar sucumbindo ao grotesco, os enredos ridículos. Tudo de um infinito mal gosto. Mas, o barulho e o silêncio que ele propiciava. Tudo é apagado. Todos os outros barulhos. O silêncio ao redor. E apenas a histeria. O som grotesco é sentido.

Travamos batalhas todos os dias. A vida é tortuosa. A vida quando é sentida, acabamos descobrindo os nossos algozes. E passamos a ama-los. Quanto mais a dor, mais vivemos. Mais compreendemos. Escrevemos poesias com sangue. Ficamos presentes quando realmente olhamos nossa face ordinária.

As tempestades são necessárias. Apenas nesse momento sentimos medo. Sentimos. Ouvimos o coração bater apressado. O sangue niilista começa a circular, morrer, transformar. Suspiramos, sentimos a tempestade. Vivemos!

**O Niilista***

Era início de março. Final de uma vida. Início de um ano ridículo. O mês sangrava. Meu corpo tinha sido sepultado depois de uma longa agonia lutando.

Não queria mais viver. Nem amar, nem esperar. Muito menos sonhar. Ou acreditar. Apenas parar. Uma pausa infinita. Sem pulsos cortados, sem lençóis presos em janelas. Sem comprimidos diários. Apenas nada.

O meu estado era passageiro. Logo, logo estaria novamente sorrindo. Sem degustações. Sem conversas amorosas. Sem encontros marcados. Sem busca de propósitos, sentidos. Sem ajuda ao próximo. A vida singela, opaca e bela.

Não queria salão de festas. Salões de belezas. Clínicas de estéticas. Nem injeções, aglutinações, feridas, enfermarias ou desidratações.

E nesse descaso matei meu niilista. E me transformei no seu vazio. Abracei com tanta força meu vazio. Até ele se transformar em mim. Nunca senti tanta gratidão por matar minhas esperanças.

 O riso era singelo. O riso. Ah, o meu riso. Nunca senti tanta alegria quando morri. Nunca senti tanta gratidão. O fim. Sem aguardar, sem buscar, sem querer, sem sentir.

Os ponteiros. Lindos ponteiros. Perfeitos ponteiros. Tudo ficou tão belo e poético. Não importava mais a desaprovação. O feio. O belo. O virtuoso. O desagrado. O assassino. A puta. A santa. Os pastores. Nada. Sem batimentos. O gozo. Ah, o gozo, sem importância, sem histeria. Somente adormecer o corpo. Morrer. Morrer e morrer infinitamente. Tanta beleza na vida, nos seus instantes.

As folhas de outono mortas e belas. O luto. A paz. A orgia. O caos. O inverno congelando. A solidão em companhia. O trabalho. As rezas. Todos os homens. Todos os altares. Crenças. Santidade. Sábados. Tudo infinitamente morto. Assassinado. Cremado. Apenas o presente em febre senil. Em novelas. Em seriados falsos.

O meu eu niilista. As sombras no final da noite. O ruído do portão do vizinho. As horas intermináveis. Os dias poucos amáveis. As putas. Os artistas. O imigrante. A mulher gritando em histeria. A televisão ligada. O ar condicionado ligado. A vida desligada. Os filhos pets. O peixinho no aquário. O penteado desfeito. A maquiagem ridícula.

O ano continuava em estações. O sol ardente, depois em chuvas amortecendo a vida. A cerveja gelada. A dor de cabeça. O noticiário repetitivo. O fim. O início. Tudo branco, pálido e singelo. O sangue na neve. Os lábios sem cor. O corpo jogado. A risada dos autores. A morte noticiada. A perda dos sentidos. A loucura em risadas. O grotesco em fotos. A demência. O aborto que sobreviveu e matou a vizinha.

As compras no final do mês. O cartão. As parcelas. Mulheres grávidas. Os bandidos assassinados. As mães paridas nas esquinas. As mãos encardidas de crack. A vida em ervas daninhas. Analfabetos, subnutridos nutrindo a sociedade. Risadas. Comédias. Hospícios dentro de viaturas. Sirene. Irene morreu. Fenicídio. Isabel pariu. Gabriely começou a vender seu lindo corpo.

Ana Clara não foi mais a escola. O moleque do oitavo ano foi visitar seu filho. Amanhã baile funk. Depois viatura. Amanhã filhos prematuros. No final de semana o enterro da avó. Na segunda-feira, o batente. O saco de cimento. A namorada com a erva na mão. O cartão de visita intima. Tudo perfeitamente niilista. Niilistas vivos.

**Sábado**

O corpo vazio. O corpo enxuto e cheio de hematomas. Carne espancada. Canções românticas. O amor glorificado. A mulher compartilhada, depois assassinada. Mulheres em valas, cigarro e cal.

Dejetos humanos. Depósito de vidas. Frigorifico em céu aberto. Deus é mesmo eloquente. A banda de rock glorifica seu nome. Eu cuspo.

Overdose niilista. Drinks suicidas. Amores desprezíveis. Filhos invisíveis. Sem sentimentos. Analfabetos. Burros de carga. Mães em portas de bancos. Doces, santinhos, frases humorísticas de algum deus.

Misericórdia. Tráfegos.  Tráficos. Usuários. Cadelas de marginais. A mãe evangélica. O vizinho oferece oferendas a Orixá. O parente ministro da eucaristia. O sacerdócio é uma criança sendo molestada com uma eucaristia na boca. Deus uma vidente cobrando a leitura de cartas. Horário marcado. O gado sendo chicoteado e numerado.  Cartelas antidepressivas.

**Sem sinal**

Saudades. Malditas lembranças. Fecho os olhos e vejo o seu rosto. Doce! Solitário. Maldito. Distante e tão perto do meu coração.

Filosofia, versos, canção niilista. Vida nobre. Morte em sacos de plásticos. Trabalho dignificante. Sombras soberbas. A luta. O desafio. A pobreza. Os guetos. O fascismo.

A bailarina dançando. Deus bêbado na porta de um bar. Mães abandonando seus filhos. O estado oferece asilo. O hospício virou museu e foi para as ruas. Cambaleando nos semáforos. A mulher grávida, grita. O assassino comemora. O trabalhador espanca seus filhos. A esposa suicida. A escola atende. O ensino purifica.

Pavilhões de estudantes. Pavilhões de doentes no corredor. Pavilhões de presos. Pavilhões de trabalhadores. Pavilhões no trânsito. A liberdade em telas, polegadas, digitais, íris. Minha janela ainda guarda meu lençol favorito. O ventilador do teto gira e refresca minha alma. Minha luz apagou. Minha glicose ficou niilista. Meus santos pularam do precipício.

Meu arco-íris esconde um pote de ouro e outro de overdose. Aberrações humanas. Humanoides decrépitos.

Falsidades, falsas idades. Gorduras em saquinhos de plásticos. Tudo enxuto. A barriga. O culote. A laringe. A solidão em cartelas. Em tarja. Saboreando um enlatado. O rosto do meu amor estampado no meu refrigerante. O rosto do meu amor no meu peito. Na minha garganta apertada, sufocada. No meu coração infinitamente niilista. Na minha pele, nos meus pensamentos. Na minha boca sussurrando seu nome.

Meu amor morto e ordinário. Uma fração do mar. Um segundo de lembrança. Uma saudade imensa. Sem sinal. Morto. Cheio de demônios. Morto. Lindamente morto. Perdido. Sufocado.

**Doença**

Parou de comer. Tomava apenas refrigerantes. Jogos pela madrugada. Na manhã, caminhava. Estava morto. Animes. Mangás. Fanfics. Os ossos eram sentidos na pele. Na superfície. A voz perdida e sem consciência. A exaustão da comunicação inconsciente. O sono. A perda de sentido.

A vida em transe. Em ebulição. O niilismo. A quimioterapia. As terapias. A doença em fase terminal. O alimento de sódio e açúcar. A doença. A namorada virtual e niilista. A professora profética e niilista. O preto. O black. A escuridão. O luto. A alegria do preto em estampas. Sombrio. Parada. Sufocada

Negro. Morto. Malditos mortos. Eles é que são felizes. Imbecis vivendo. Munição dos jogos. Cadelas prostituídas. Cães em matilhas no final do jogo. Viaturas. Canções poéticas. A vizinha foi assassinada. Os filhos foram para o cativeiro. A avó criou. Cadela maldita.

O sorriso em cárie. O crack. O perdão sangra. Extremamente belo. Doenças urbanas. Paixões vadias. Trocado. Vidas em cadeados, jaulas em roletas. Portas giratórias, crédito, chip, dengue, metáforas. Água parada. Vala. Lindas valas. Chão. Buraco. Vida. Flores niilistas. Pets. Internet. Estupro. Amor em orgia. Banquete. Filósofos. De novo o crack e a favela. As munições e suas valas. Tudo morto.

A velha na cadeira de rodas. As freiras distribuíam sorvete. E o circo cantava. A doença. A morte. O arroto. A fralda. A velha desprezível. Lembranças. O chip desgastado. Girando, girando até amortecer a alma.

A bebida. O álcool. A perda. O oxigênio niilista. O fim. A prisão. Viver até o último minuto. Suportar a vida. O outro. Os outros. A rotina. A mesmice. Pedir licença. Trepar até o amanhecer. Vomitar. Reiniciar. O final de semana. A esperança no corpo de uma velha com Alzheimer. O cabelo ruivo. A prótese. O implante. Os leitões abatidos e ensacados. Tudo muito bonito. A missa do cristão. A eucaristia. A santidade. A doença. Novamente a bebida. O corpo de Cristo e em Cristo. Lindo, lindo, soberbo.

**O silêncio**

O maldito silêncio da sua decisão. Seu jogo estranho. Difícil compreender seus pensamentos. Tramas. Plantões viagens. Depois o culto. A assembleia. As lutas. A equipe. A roda em aros. A literatura abrandando seus demônios pessoais. Os noticiários cheios de delinquentes. A ovelha e o lobo mau. Sem perdão.

O frigorifico. Os leitos. As selas. O escrivão. O doente. O niilista. O poeta. A canção do suicida. Tanta beleza exposta. Posta nas redes. O ensejo. O desejo. O gozo rápido e eficaz. O desprezo. A artéria niilista. Os passos cada vez mais apressados. Táxi. Uber. Trilhas. Selvas urbanas e contemporâneas.

O seu beijo que não desfrutei. Sua carne que não consumi. Seu corpo moldado e arranhando junto ao meu. Seu olhar que não desviei. Suas mãos que não percorri. Por dentro um coração escuro e doentio. Nuvens sobre o espaço. Saudades de nosso silêncio.

**Niilismo**

Era sábado, final de uma vida, início de ano. Tinha esgotado todas as minhas esperanças. Todos os meus desejos. Apenas vazio e nada mais. E ele soberbo me olhou de frente. Sucumbi a cada olhar. A cada silêncio compartilhado.

No passado apenas telas, tempo parado, vida contemplada sobre o assento de um banco de madeira. Nunca fui protagonista de outras vidas. Apenas da minha. Em todos os inícios de ano, apenas, olhei, presenciei, nunca vivi ou interpretei. Apenas o tempo, caminhava e vivia. E nesse tempo, eu apenas olhava. Olhei almas dispersas, fragmentadas, dissolvidas, prostituídas, embriagadas. Apenas pessoas interpretando papéis humanos. Vidas humanas, vícios corrosivos no desenrolar de seus papéis malditos.

Apenas contemplei a vida, os outros, o outro. Sozinha, só, absolutamente perdida, sentada em uma cadeira comendo pipocas. Não sou de afeto, meu sangue é niilista, minha vida bizarra, meus gestos egoístas, minha boca silenciosa, meu corpo indigesto, minhas amizades infalíveis, invisíveis, vazias.

E a cada ano as trocas de estações, mas somente a primavera era bela. Depois migalhas, calor, chuvas, folhas caídas e o lindo inverno congelando tudo, matando qualquer vida, soberbo. Mas, as flores sempre foram mais fortes, lindas. No final vencemos, conseguimos sobreviver. Apenas na morte, nesse adubo incerto, belo, florescem flores. A vida vale a pena em todos os sentidos.

Uma vida inteira vazia, e no final apenas um segundo de olhar, muda tudo, faz valer todos os anos insignificantes. E no final, apenas um segundo, uma faísca, e a vida foge das telas e alcança um corpo enfermo. O amor. Apenas essa chama que preenche a vida.

Nessas estações todas foram niilistas, vazias, fragmentadas. Apenas solidão, descompasso. Instantes de beleza. Os homens perderam as estações. Nesse transitar da vida, sobrou apenas a árvore de natal e seus enfeites. O desenrolar do ano vazio, sem ceias, confraternizações, alegrias, afetos. Tudo em ponteiros lindamente perfeitos.

Todos os anos os ponteiros giram em perfeita harmonia. A ampulheta tatuada no braço marcando o fim, depois o reinício. A vida uma sucessão de reinícios, vazia, niilista, empobrecida, arruinada. E você por um milésimo de segundo arrancou meu peito junto com todo o vazio niilista. Mas, no final apenas vazio.

Valeu cada segundo não vivido para esse momento corrosivo. Esse instante soberbo, frio e indigesto. Você! Meu niilista! Somos todos niilista. Vazios e insignificantes. E no frio do inverno percebemos que temos vida. E na primavera sorrimos. E a cada nova estação sobrevivemos.

(Primavera de Oliveira)

23 de setembro de 2018.

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